Capítulo / Chapter II | Cinema – Cinema

The FILMar project: the reconfiguration of cinephilia and the new authors

O projeto FILMar: a reconfiguração da cinefilia e os novos autores

Paulo Portugal

NOVA – FCSH, Portugal

Abstract

Heritage cinema has been the most relevant forum for debate around the reconfiguration of cinephilia. Especially in an era dominated by successive technological challenges responsible for the reconfiguration of the cinematic landscape. From digital reconversion emerge new practices and methodologies, expanding the diversity of the film archive. We propose to investigate the different articulations in which the FILMar project mediates the history and diversity of the national archive. Recovering the urgency of industrial cinema and even the reflection of colonialism in cinema, we focus on the works of future authors who found in ‘useful cinema’ and in ‘industrial cinema’ a decisive space for experimentation at the beginning of their careers. These are the cases of José Fonseca e Costa, António de Macedo, Fernando Lopes and Fernando Matos Silva. In this intersection with the past, the film practices of the 20th century are mediated and interconnected in a collective and interdisciplinary way.

Keywords: FILMar project, Cinephilia, New Cinema, Useful cinema, Industrial cinema.

Introdução

O projeto FILMar1 operou uma autêntica transformação do património do cinema português devolvendo, através da recuperação digital, uma parte menos conhecida do espólio que se arriscava a não ficar inscrito na memória coletiva. No desenho de um programa com mais de um século da história do cinema português2, através de um foco da sua ligação marítima, o FILMar revela-se, igualmente, um verdadeiro ‘mar de filmes’. É a partir deste mapeamento aquático que se propõe uma discussão de cinefilia em torno de um conjunto de filmes que merece ser devidamente investigado.

Após a análise das 119 curtas metragens do projeto FILMar, tornou-se percetível a presença de vários cineastas importantes do movimento conhecido por ‘Novo Cinema’, autores de filmes de encomenda, realizados em início de carreira, ao longo da década de 60. Destacamos quatro dos nomes mais relevantes desse período3 : José Fonseca e Costa, António de Macedo, Fernando Lopes e Fernando Matos Silva. Destes autores selecionámos um conjunto de seis filmes, de curto formato: Verão Coincidente (1962) e Albufeira (1968), de António de Macedo; ...E Era o Mar (1966) e Regresso à Terra do Sol (1967), de José Fonseca e Costa; Tejo - Rota do Progresso (1967), de Fernando Lopes e Tejo - Na Rota do Progresso (1967), de Fernando Matos Silva.

Temos então dois filmes de Fonseca e Costa e dois de António de Macedo, além de um par de filmes (quase com o mesmo título e sobre o mesmo objeto), de dois Fernandos, o Lopes e o Matos Silva.

O critério que presidiu à escolha, além da disponibilidade no programa FILMar, foi o da qualidade, na tentativa de registar esse “desejo de ruptura, de mudança, de urgente renovação estética da cinematografia portuguesa” (Cunha 2024, 31). Mesmo quando essa mensagem se encontrava camuflada pela capa da promoção.

De salientar que o conjunto de filmes selecionado é totalmente representado pelo termo de ‘filme alimentícios’, a expressão feliz, empregue por Ricardo Vieira Lisboa, em uma das folhas da Cinemateca referente ao programa FILMar. No entanto, o significado é acertado. Por um lado, e por questões económicas, os cineastas necessitavam desse trabalho; por outro ´alimentavam´ a fome de experimentação e expressão artística; por fim, embora tenham sido desenvolvidos durante o Estado Novo, a linguagem metafórica destes trabalhos, talvez por serem curtas metragens, contornou a censura.

Apesar da pouca visibilidade e de uma ainda menor inscrição no discurso de cinema, afloramos esse cinema ‘menorizado’, na convicção dos princípios norteadores do FILMar, nomeadamente, por uma importante missão:

revelar as cadeias comunicantes entre os filmes institucionais, de propaganda, de indústria, de promoção turística, de desenvolvimento económico, de ficção, de animação e de documentário, propondo entre eles a ligação por demais evidente: como fixaram a nossa relação com o mar (Costa 2024, 10).

E como olhar hoje para este corpus de filmes, procurando detetar traços de arte num cinema de cariz utilitário? Talvez não seja de desprezar o facto deste grupo constituir uma “pequena comunidade nascida da cinefilia extrema”, como define José Manuel Costa, no texto de abertura do catálogo que a Cinemateca Portuguesa dedicou ao cineasta Fernando Matos Silva, durante a sua homenagem em janeiro de 2024. Ora, é também parte dessa ‘comunidade’ que estará associada à geração do ‘Cinema Novo’ ou ‘Novo Cinema’, numa expressão ainda não totalmente isenta de debate4.

A primeira parte deste artigo será dedicada à análise do período e dos circunstancialismos em que os realizadores conceberam estes trabalhos, salientando algumas das suas particularidades. Em seguida, propõe-se um estudo atualizado em redor do projeto FILMar e da cinefilia, identificando os elementos artísticos capazes de enquadrar os filmes, não só na carreira dos seus autores, bem como à luz das transformações que acompanham a cinefilia nesta era digital.

Confirmando-se a escassez de fontes bibliográficas referente a estas curtas metragens, privilegiou-se o acesso às duas edições organizadas a propósito do projeto FILMar e editadas pela Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema5 : o conjunto de artigos agrupados em Última Vaga (2024) e a edição dos Cadernos da Cinemateca dedicada ao FILMar, compilando as folhas de sala publicadas nas diversas sessões. Assim se procurou identificar dentro da história do cinema português “relações que permitam pensar de que modo o mar se constituiu como elemento narrativo” (Mendonça et al. 2024, 30).

Uma nota sobre a intenção de suprir eventuais lacunas e injustiças que um artigo, necessariamente seletivo como este, implica. Ainda que deva ser suprido pelos previstos ‘regressos’ da investigação em curso sobre o FILMar. Em todo o caso, assumindo a seleção de curtas metragens relevantes da autoria dos mais importantes cineastas conotados com o Novo Cinema. De fora ficam diversos filmes/autores que justificariam um trabalho autónomo, pela relevância que têm no nosso património fílmico. Entre vários, destacamos os casos flagrantes de As Ilhas Encantadas, de Carlos Vilardebó, e Catembe, de Manuel Faria de Almeida. Ainda em relação ao elenco escolhido, assinala-se a ausência, necessária, mas sentida, do fotógrafo-cineasta Augusto Cabrita, pelos diferentes contributos para a ‘cara’ do Novo Cinema.

O cinema útil antes de ser Novo

Figura 1 - Regresso à Terra do Sol (1967), José Fonseca e Costa

Importa realçar que a década de sessenta foi madrinha da carreira documental de vários cineastas jovens, como José Fonseca e Costa (A Metafísica do Chocolate e A Cidade), Fernando Lopes (As Palavras e os Fios, Cruzeiro do Sul, incluído no FILmar) ou António de Macedo (Nicotaina, Alta Velocidade, Crónica de um Esforço Perdido). Eles que testemunharam a letargia herdada dos frouxos anos cinquenta, período marcado por diversas tentativas falhadas de criar um modo de produção cinematográfica equilibrado. A partir da cronologia desta meia dúzia de filmes - entre 1962 e 1967 – mapeia-se um período dominado pela afirmação de diversos cineastas e de filmes significativos de um cinema em mutação.

Registe-se a importância que teve a criação, logo em 1961, do I Curso Universitário de Cinema Experimental, dirigido por António da Cunha Telles. Tal como o início da concessão de bolsas da Gulbenkian, permitindo o germinar de toda uma geração de autores e técnicos. De acordo com Luís de Pina, esse é o momento em que “o cinema português começa a encontrar o caminho” (Pina 1978, 45).

Logo no ano de Verão Coincidente, estreava também Dom Roberto, a primeira (e única) longa-metragem do cinéfilo e cineclubista, Ernesto de Sousa, considerada uma obra fundadora do Novo Cinema, a par com Verdes Anos, de Paulo Rocha que estrearia um ano mais tarde, tal como Acto de Primavera, de Manoel de Oliveira. Esse é ainda um ano importante para as aspirações do jovem José Fonseca e Costa, que ganha um prémio no I Festival de Filme Publicitário.

O período entre 1963 e 65 será determinante para concretizar esse ‘desejo de rutura’, com a estreia de Verdes Anos, de Paulo Rocha, em 63 e Belarmino, de Fernando Lopes, no ano seguinte, bem como As Ilhas Encantadas, de Carlos Vilardebó (um dos essenciais FILMar), em 65. E filmes marcantes para Fernando Matos Silva que assegurou a assistência de realização em todos eles. Entretanto, aproveitando a energia da produção de Cunha Telles, António de Macedo concretiza o seu Domingo à Tarde, E Fonseca e Costa ...E Era o Mar. Estreia ainda o projeto malogrado e amputado Catembe (FILMar), de António Faria de Almeida, logo proibido e impedido de estrear. Transformar-se-ia num verdadeiro ‘caso’ que a investigadora Maria do Carmo Piçarra verteu no estudo Catembe, Esse Obscuro Desejo de Cinema. Seria ainda o ano de Paulo Rocha sugerir Mudar de Vida.

Nesta altura, a vida de Fernando Matos Silva estava também a mudar, pois aceitara, em 1967, participar na Média Filmes, fundada por Fernando Lopes, que o haveria de convidar para dividir o projeto Tejo - (Na) Rota do Progresso. A “Semana do Novo Cinema Português”, promovida por Alves Costa, no Cineclube do Porto, de certa forma proclamando “o triunfo do ideal cineclubista de transformação do cinema português por via da cultura” (Pina 1977: 119). Essa nova vaga terá uma característica comum, pois irá inspirar-se sobretudo na realidade social portuguesa e, em certa medida, imbuída por uma intenção de de cinema de resistência.

No mesmo período, António de Macedo ultimava a sua segunda longa, Sete Balas Para Selma, enquanto que Fonseca e Costa voltava a Angola com o seu Regresso à Terra do Sol, com uma mensagem subliminar sobre o colonialismo. Por fim, o turbulento ano de 1968, era marcado pela mudança da cadeira de Salazar pela de Marcelo Caetano à frente dos destinos do país. E talvez até a esperança de uma certa abertura. De certa forma, espelhada pela forma mais livre como Macedo devolvia a ‘encomenda’ turística Albufeira. Nem de propósito, chegada às bancas, justamente nesse período, o caderno “Novo Cinema, cinema novo”.

Um fator a unir este grupo de cineastas será precisamente a habilidade em incorporar uma dimensão de documentário. Afinal de contas, esse cinema que ‘nunca chegou a começar’ acabou por ‘encontrar o caminho’. Em particular, procurando as pistas fora dos trabalhos de longo formato, ou no ‘cinema útil’ como aqui propomos.

Apuremos então o significado desta expressão pouco usada no léxico dos estudos de cinema. Para simplificar, procuram-se respostas do lado da produtividade, vista como característica fundadora do ‘cinema útil’. Na tentativa de conceptualizar o termo, seguimos a edição de Charles Acland e Haidee Wasson, intitulado, justamente, Useful Cinema, enquadrando-o da seguinte forma:

um conjunto de filmes e tecnologias que desempenham tarefas e servem de instrumentos numa luta contínua pelo capital estético, social e político (Acland, Charles e Wasson 2011, 3).

Mais comum será a designação de ‘cinema industrial’. Talvez um conceito tão antigo quanto o próprio cinema. O género que terá nascido com a exibição de A Saída dos Operários da Fábrica Lumière, em 1895, foi estudado e compilado por Vincenz Hediger e Partrick Vonderau, em Films that Work. Nessa obra, Thomas Elsaesser assina um texto onde explora o que chama ‘Arquivos e Arqueologia’, referindo que “há muitas histórias da imagem em movimento, das quais apenas algumas pertencem ao cinema” (Hediger e Vonderau 2009, 19).

Ora é um pouco esta ‘arqueologia’, esta ‘escavação’ que desperta a atenção nos casos FILMar, procurando identificar diferentes genealogias da história do cinema português.

Em pleno século XXI, o cinema tem sido sinónimo de portabilidade, maleabilidade e até uma certa ubiquidade. A verdade é que, em meados no século passado, o tradicional ecrã de cinema (e a sala escura) não era o único espaço de partilha de imagens. Esclarece a investigadora Haidee Wasson6 que à entrada da década de sessenta, nos Estados Unidos, por cada ecrã de cinema em funcionamento, existiam 263 projetores portáteis em uso. Um número avassalador, sobretudo se considerarmos a escala exponencial a que chegou duas décadas mais tarde, sendo em 1980, 1 ecrã para 1000 projetores portáteis! Números que permitem imaginar a tremenda variedade de imagens em cinema útil exibido, não só em escolas, mas também em fábricas e outros espaços fora da sala de cinema. Faz sentido convocar aqui a dualidade kantiana para indicar que o cinema não será apenas sinónimo de arte e entretenimento, já que se aproxima muitas vezes da sua dimensão puramente funcional. Embora sem nunca deixar de ser cinema.

Na sequência do surgimento das novas tecnologias digitais e das renovadas plataformas de exibição emerge o presente debate centrado na necessidade de promover formatos menos ‘nobres’ e apostar:

na diversidade de géneros – o filme turístico, a publicidade, o filme industrial, o filme cultural, o jornal de atualidades, entre outros – que eram, de facto, a base da frágil e precária indústria cinematográfica de então (Cunha 2024, 11).

Como veremos adiante, será a partir daqui que surge a intenção de um enquadramento na discussão em redor das novas cinefilias. Seja a convocar o cinema de turismo ou de indústria, embora sempre num jogo hábil entre o desenvolvimento local e a tentativa de conjugar a técnica com a arte.

A verdade é que o conjunto de filmes escolhido reflete precisamente um período marcado por uma acentuada transformação económico-social, motivada não só pela chegada da televisão (a RTP inicia sessões regulares em 1957), mas também pelo impulso da publicidade, implicando a procura de técnicos com elevado grau de exigência. Ora isso permitiu a estes jovens cineastas aplicar os seus conhecimentos e criar um percurso singular, senão mesmo paradoxal, entre o cinema do real e a ficção.

Importa referir ainda a preparação teórica e prática dos cineastas considerados, à qual não será alheia uma eventual ideia subterrânea de resistência. A experiência foi alcançada pela possibilidade de formação no estrangeiro, em particular nos casos de José Fonseca e Costa, ainda que sem apoio, de Fernando Lopes e Fernando Matos Silva - o primeiro trabalhando em Itália (como assistente estagiário de Michelangelo Antonioni, em O Eclipse) e em Hollywood, e os dois Fernandos na London Film School.

Ainda que Fernando Lopes seja conhecido sobretudo pelo seu trabalho na ficção (Uma Abelha na Chuva, de 1971, ou Crónica dos Bons Malandros, 1984), o começo de carreira muito auspicioso foi ligado ao cinema do real. Aliás, Belarmino será um documentário charneira no despoletar do Novo Cinema, colhendo influencia do cinema direto britânico e dos estudos de cinema em Inglaterra e depois nos Estados Unidos.

É também durante o período londrino que o caminho de Matos Silva se cruzará, de novo, com o de François Truffaut (tinha colaborado brevemente com ele na rodagem em Lisboa de La Peau Douce, com produção de Cuinha Telles). Precisamente quando o realizador francês filmava Farenheit 451, o que acabaria por influenciar o português a assumir um tom de ficção científica na sua curta metragem de escola, Marionettes Inc.

Apesar de Matos Silva ter estudado na mesma London Film School, como Lopes, e de ter uma carreira, essencialmente no “cinema a fazer a realidade”7, estrear-se-á na ficção, com O Mal-Amado (1974), o filme que ficaria para a história, como o último filme a ser riscado pelo lápis azul da censura, mas também o primeiro a estrear após o 25 de Abril.

O paradoxo continua com António de Macedo (Domingo à Tarde, em 1965) e José Fonseca e Costa (O Recado, em 1972), a comungar um início de carreira com vários documentários. Por sinal, talvez os dois cineastas que melhor revelam essa habilidade em explorar a linguagem do cinema em contextos adversos.

António de Macedo foi o mais autodidata deste grupo. Ainda adolescente, produz os seus próprios filmes com o material fotográfico que os pais, ambos trabalhadores na Kodak, traziam para casa.

Contextualizemos o que se passava no país na década de 60, por forma a obter uma análise mais profunda dos filmes selecionados. À medida que alguns realizadores iam lentamente impondo o seu cinema, ao longo da primeira metade da década de sessenta, em grande parte devido ao empenho do produtor António da Cunha Telles, assiste-se, paralelamente, ao incremento do formato curto, como confirma Luís de Pina:

As empresas industriais e comerciais, os bancos, dispondo de largo capital inativo dão ao cinema, sobretudo aos cineastas jovens, que são capazes de assegurar à difusão uma linguagem mais moderna e uma qualidade formal superior. Alguns serviços públicos praticam a mesma política e encomendam obra de prestígio. Desta maneira, a nova geração, praticamente impedida de alcançar a longa-metragem, pratica o seu ofício no filme curto, desde o filme publicitário ao documentário patrocinado (Pina 1977, 74).

Em 1978, Luís de Pina refere-se à ‘reviravolta’ do cinema português, sublinhando o papel do formato alternativo:

A curta metragem torna-se mais moderna, menos retórica, menos propagandística, muito embora o setor da publicidade recorra cada vez mais ao cinema e muitos dos novos valores nela trabalhem realizem excelentes filmes (Pina 1978, 45).

Esta era uma geração fortemente moldada pela cinefilia europeia e internamente acarinhada pela força do movimento cineclubista. Com a particularidade da vigência e controlo da censura, desde a mudança de regime a partir da queda da 1ª República em 1926.

A noção de cinema trazida por estes jovens não é agradar, mas fazer pensar, não é criar uma narrativa simples, mas distanciar o espectador, não é fazer igual à realidade, mas evidenciar os mecanismos que tornaram o filme diferente dela” (Pina 1978, 52).

Cinema Novo ou Novo Cinema? Como se sabe, independentemente da designação, a adesão não foi pacífica pelos profissionais. Nomeadamente, pelo não alinhamento de Fonseca e Costa: “não tenho nada a ver com o ‘cinema novo’ (Plateia 1974, 26), sublinhando a falta de unidade estética entre os diferentes autores. Ainda que fosse precisamente esse desalinhamento uma das principais forças. De qualquer forma, independentemente da discussão conceptual, a expressão ‘novo cinema’, ou mesmo ‘cinema novo’, já tinha sido assimilada.

Em todo o caso, Paulo Cunha insiste no termo mais adequado: “continuo convencido de que mais do que factores subjectivos e aleatórios, o Novo Cinema português se apresenta como a expressão mais correcta e abrangente para identificar um período do cinema em Portugal que conheceu várias propostas formais e informais de renovação estética e técnica do cinema” (Cunha 2024, 56).

FILMar e reconfigurar a cinefilia

Ao longo deste artigo, temos refletido sobre um conjunto de curtas metragens, pertencentes ao acervo FILMar, procurando o devido contexto no cinema útil ou de encomenda. Falta agora aferir de que forma a qualidade desse gesto se enquadra numa reconfiguração da cinefilia nesta era digital. Há uma década que o teórico alemão, Malte Hagener, se debruça sobre a urgência de um renovado olhar ao tema, sublinhando a necessidade de:

uma compreensão da cinefilia contemporânea enquanto uma prática que se ramificou, abraça e utiliza os desenvolvimentos tecnológicos, ao mesmo tempo que transforma as lições da primeira geração da cinefilia. A cinefilia contemporânea, tal como a sua antecessora clássica, relaciona o presente com o passado… (Valck, Hagener 2005, 22).

Chegados a este ponto, independentemente das convicções artísticas de cada um dos realizadores considerados, importa procurar nas diversas encomendas, uma inscrição das componentes técnicas utilizadas, e, em especial, uma visão artística que supere o mero cumprimento contratual das propostas. Naturalmente, isso não será sempre visível, sobretudo quando o registo está intimamente ligado à ‘utilidade’ intrínseca do projeto. Nomeadamente, quando o objeto, ou o ‘produto’ é estritamente industrial, como o caso da encomenda da Lisnave.

Comecemos então pelo esse exemplo mais exigente: Tejo - Rota do Progresso e o seu filme gémeo, Tejo - Na Rota do Progresso. Resulta da intenção da Lisnave em filmar a construção no Estaleiro da Margueira, na altura, o maior da Europa e um dos maiores do mundo. Com a particularidade de se pretenderem duas versões: uma em 35 mm, outra em 16mm. A primeira, Tejo – Rota do Progresso, seria mais institucional e entregue a Fernando Lopes, que deveria filmar a cores, beneficiando uma produção mais cuidada (incluindo três operadores de imagem), e para ser exibido, como complemento, nas grandes salas de cinema e destinado a um público classe média; a outra versão, a que apenas juntava ao título Tejo, ‘Na’ Rota do Progresso, foi atribuída a Fernando Matos Silva, no que seria o seu primeiro filme-encomenda; ele que, entretanto, se associara a Fernando Lopes, juntamente com o seu irmão, João Matos Silva, na Média Filmes, de Fernando Lopes, já depois de regressar da London Film School.

De que forma poderemos então considerar este filme dentro de uma leitura cinéfila? Talvez começando pelo óbvio contraste entre a versão de luxo e a versão popular. Esta seria captada a preto e branco, por Augusto Cabrita, usando som direto e para ser destinada a coletividades, cinemas de reprise e a empresas. Se será inegável a formação cinéfila de ambos os Fernandos, ainda assim, faz sentido evocar algumas diferenças: por exemplo, o uso que Lopes faz da banda sonora jazística, entregue a Manuel Jorge Veloso, com quem trabalhara em Belarmino, bem como uma certa dinâmica que a sua equipa de três operadores de imagem encontra em certos planos e composições “uma forma de dar igual preponderância à figura humana e à monumentalidade da construção e das embarcações” (Vieira Lisboa 2024, 142). Já a versão de Matos Silva aproxima-se mais desse lado experimental da reportagem, por certo a pensar no cinema direto e nas técnicas absorvidas na London School of Film Techinque.

Talvez faça sentido referir que Matos Silva haveria de ficar responsável (juntamente com Monique Rutler) pela montagem das dezenas de película filmada durante o 25 de Abril e o 1º de Meio de 1974 e que daria forma ao filme de conjunto lançado em 1975, As Armas e o Povo.

Considerando agora a deambulação ‘veraneante’ de José Fonseca e Costa e António de Macedo, parece-nos inegável e conseguida, em ambos os casos (portanto, ...E Era o Mar, Regresso à Terra do Sol, bem como a Verão Coincidente e Albufeira), apesar de uma intensidade, intenção estética e artísticas diversas. Na altura, tinha Fonseca e Costa 33 anos e uma vontade indómita de fazer cinema. E o que faz o cineasta, depois de regressar de Itália, ansioso por aplicar toda a experiência adquirida como Antonioni na rodagem de O Eclipse (1961)?

Pois bem, transforma a ‘encomenda’ de filmar Hotel do Mar, em Sesimbra, num artificioso exercício de cinema. Sobre a metodologia empregue na rodagem, dirá em entrevista, em 2015 (menos de um ano antes de falecer):

a minha atividade como realizador de filmes de publicidade e de documentários de publicidade tem muito a ver com uma série de vícios com que eu fiquei no que respeita à construção dos filmes, à organização das imagens e aquilo que se deve fazer com o que se quer filmar (Sampaio, Mota e Sá 2015, 130).

A ideia inicial era um típico filme visando a descrição promocional. “Só que eu fiz outra coisa, fiz um filme sobre uma obra de arquitetura que é uma obra de arte”. Afinal de contas, mais sobre o ponto de vista artístico do arquiteto, que haveria de defender Fonseca e Costa. De resto, o resultado seria severamente criticado pelo dono do hotel, o Sr. Alcobia, pouco contente com esse “exercício formal sobre a linha pura da arquitetura”, como descreve (Mendonça 2024, 34). Já agora, com a liberdade da câmara de Elso Roque que, por vezes parece captar os turistas ‘presos’ no quadriculado das varandas do hotel, gerando uma atmosfera de angústia. Sobretudo quando monta habilmente a uma pilha de caixotes de madeira, com o ‘quadriculado’ de varandas. Para bom entendedor...

Nessa altura, Fonseca e Costa já tinha um passado de ativista político, e militante do MPLA (nascido em Angola), tendo inclusive estado preso, o que o impediu de ingressar nos quadros da RTP.

Ainda assim, um ano mais tarde, volta a Angola, a sua terra natal, para um Regresso à Terra do Sol (1967). Desta feita, cumprindo o contrato promocional com o Banco Comercial de Angola. Uma vez mais, o cineasta consegue injetar uma boa dose de ironia subliminar, ao encenar um artificioso jogo de contrastes, onde as imagens em redor da imponente torre do Banco Comercial de Angola (BCA) acabam por impor uma dimensão de turbilhão e contraste colonial que choca de frente com o semblante carregado das gentes e dos pescadores pacientemente à espera do peixe. De tal forma que o crítico Jorge Leitão Ramos encontrou mesmo aqui “o primeiro filme manifestamente anticolonial do cinema português” (Ramos 1989, 107). E isto uns anos ainda antes de realizar o seu primeiro filme de fundo, em 1971, O Recado.

Figura 2 - Albufeira (1968). De António de Macedo

Há uma maturidade inegável no cinema de António de Macedo. Algo que se reflete bem nos filmes digitalizados pelo projeto FILMar. Sobretudo em que o lado mais experimental da linguagem cinematográfica parece encobrir uma vertente mais arquetípica desse tipo de produção. Mesmo que separados por seis anos, Verão Coincidente (1962) e Albufeira (1968), não deixam de ser dois exemplos maiores da promoção do turismo em Portugal. Sobretudo como filmes que escapam à cartilha e à fórmula descritiva, aproximando-se assim de narrativas a pensar em espaços de liberdade.

Fica claro nestes dois filmes o voluntarismo estético deste cineasta original, um dos principais fundadores do Cinema Novo. E talvez aquele - de todos os deste grupo - que mais impôs uma estética própria.

Em Verão Coincidente, o seu primeiro filme industrial, subsidiado pelo ganho com um filme amador (em 8mm), Macedo apura a forma visual da expressão poética dos contida nos versos de Maria Teresa Horta. A sua modernidade excita-se numa montagem extremamente visual, bem apoiada pelo jazz da banda sonora, oscilando numa permanente rima entre as imagens de água e sol e a poesia. Dessa forma consegue Macedo subverter ao documento a sua própria coerência. O processo resulta em cheio nessa destruição da convenção, da ‘verdade’, do documentário. Albufeira é um projeto bem diferente, em que Macedo usa o seu lado alternativo dentro da linguagem cinematográfica urdindo uma narrativa. Ao ensaiar a ideia de uma falsa reportagem sobre a veraneante vila algarvia, por parte de um trio de turistas de uma revista de viagens, contorna a lado mais modelar desse tipo de produção. O filme, exibido na sessão de inauguração do DocLisboa 2024, acaba por funcionar, precisamente graças a esse isco, deixando ate um final aberto de tom provocador.

Ao considerar a particularidade destes registos de não-ficção, e que nos chegam com uma qualidade digital a rimar com a do momento da sua estreia em sala, é como se nos aproximássemos de um outro tempo, sem a camada de ‘tempo’ que a materialidade da película, por vezes, sugere. Algo visível sobretudo na proximidade à piscina com Hotel do Mar, captada por Fonseca e Costa, em 1966, ou nas vistas de Albufeira, de Macedo, em 68, ou até o ambiente industrial nas docas da Lisnave, em 67.

Não será essa a capacidade do ‘ato de memória’, ou o tal ‘love that never dies’, referido por Thomas Elsaesser, que se complementa com Paul Willemen ao referir: “algo que está morto, é passado, mas que permanece vivo na memória” (Willemen 1994, 227).

Talvez até as diferentes possibilidades de interpretações dos filmes produzidos no contexto do projeto FILMar, se sintetizem à luz da cinéfila. Talvez até a partir do enquadramento que interpreta o valor cinematográfico e simbólico das imagens. Porque, como bem salienta Leonardo Aboim Pires:

Ver um filme presume uma observação que consiga abranger, de uma forma exequível, as imagens que nos surgem diante do olhar do mesmo modo como foram feitas e entendidas pelos realizadores e cineastas. Por forma a interpretar o valor cinematográfico, é nesse campo que, arriscando a fragmentação dos elementos que compõem a obra, podem surgir (re)leituras quanto à função do filme, seja ele documental, ficcional ou publicitário, como fonte de compreensão da realidade social em que estes despontaram (Pires 2024, 93).

Conclusão

Verificou-se que os diversos cineastas considerados ao longo deste estudo aplicaram ao seu cinema uma dimensão de experimentação que viria a ter o devido reflexo autoral nas obras subsequentes. Sobretudo, ao longo da década de sessenta, em que muitos trabalharam em televisão, ainda que também em cinema. Mesmo quando as produções são motivadas por uma dimensão ‘alimentar’, terá ficado demonstrada a forma como cada um dos os futuros autores usaram técnicas e códigos apreendidos com a formação adquirida no estrangeiro – ou simplesmente através da experiência e iniciativa técnica - conseguindo ir um pouco mais além no alcance da obra. Desta feita, impondo um estilo que evitou cair no ‘institucional’ e manter ao largo as adversidades da vigilância censória.

É esta marca FILMar que estabelece esta multiplicidade de propostas oferecendo igualmente uma renovada possibilidade de estabelecer diversas cadeias de comunicação:

entre os filmes institucionais, de propaganda, de indústria, de promoção turística, de desenvolvimento económico, de ficção, de animação e de documentário (Costa 2024, 10).

Posto isto, fica em aberto a proposta de um prolongado diálogo, de um debate aberto sobre este tipo de cinema que grita por uma oportunidade de reinterpretação. Seja nos cineclubes, enquanto verdadeiras incubadoras de novas ideias, mas também em festivais, enquanto espaços privilegiados de apreciação crítica e discussão estética. Ou em espaços de conferência como em Avanca.

À medida que acompanhamos as diferentes propostas de consumo de cinema neste novo milénio, vão sendo também atualizadas formas de cinefilia, sugerindo o estabelecimento de renovadas ligações com o cinema. Seja pelo acesso a novas tecnologias, pela forma como o filme se relaciona connosco e suscita novos elementos de debate e questões que passam a fazer parte de um discurso de cinefilia. Num texto de abertura do FILMar, dedicado às curtas metragens. Luís Mendonça deixou no ar algumas dessas novas pistas, e que normalmente escapam a discursos de cinefilia:

Os filmes reunidos apontam, ainda, para leituras que antecipam questões que hoje são prementes, como a sustentabilidade dos oceanos, as condições laborais, os fluxos migratórios ou a identidade histórica nacional. Os filmes são, ainda, exemplares no modo como respondem a diferentes encomendas, tratando de fixar, pelos discursos, pelos rostos, ou pela relação do mar com o espaço (geográfico, territorial, arquitetónico e emocional), modos narrativos de interpretar a memória, a história e a condição do homem perante o poder da natureza (Mendonça 2024, 31-32).

Notas finais

Parece-nos que fica clara a necessidade de manter um debate em torno do cinema de passado, como forma de prolongar uma revisão e atualização do conceito de cinefilia. Sobretudo numa altura em que o acesso ao património fílmico se torna mais flexível permite um estudo mais ambicioso. Não só pela descoberta de novas fontes, como também por uma metodologia que permita enumerar os efeitos da experiência de cinema, permitindo alcançar a estratégia desejada e compreendendo “o modo como o realizador concebe o cinema e como o cinema nos permite pensar novos olhares sobre o mundo” (Penafria 2009, 7).

Concluímos, na esperança que tenha ficado claro esse arco na viagem a um cinema, pouco analisado - se não quase esquecido -, pelo menos, pouco visitado:

A nova cinefilia está a transformar o arquivo ilimitado da nossa memória mediática, incluindo os pedaços e partes não amados, os filmes ou programas há muito esquecidos, em clips, extras e bónus potencialmente desejáveis e muito valorizados, o que prova que a cinefilia não é apenas um amor ansioso, mas pode sempre transformar-se numa perversão feliz (Valck, Hagener 2005, 41).

Notas

1Uma iniciativa, desenvolvida pela Cinemateca Portuguesa e o Mecanismo Financeiro Europeu EEAGrants 2020-2024, digitalizando 267 títulos do cinema português, relacionados com o mar, sendo 119 curtas e 68 longas metragens.

2Sendo A Sea Cave Near Lisbon (1896), de Henry Short, o filme mais antigo, e o mais recente A Espada e a Rosa (2010), de João Nicolau.

3Optou-se por excluir Augusto Cabrita, por ser menos conhecido como realizador, mas mais como fotógrafo e, sobretudo, como diretor de fotografia. Desde logo, em Belarmino (1964), de Fernando Lopes, um dos primeiros filmes no Novo Cinema português.

4O investigador Paulo Cunha dedica um estudo aturado a essa questão, em Uma Nova História do Novo Cinema Português, de 2024.

5Entre 12 de junho de 2021 e 30 de abril de 2024.

6Conferência Universidade Concórdia, em 2019: https://www.youtube.com/watch?v=n_-Cw3yAfys, acedida em 15/05/2025.

7Como refere o realizador, em entrevista concedida à revista ANIKI, conduzida por Sofia Sampaio, Gonçalo Mota e Sérgio Bordalo Sá, em 2015.

8Apesar de se basear num lapso, cometido durante uma entrevista (à investigadora Raquel Paulo Rato), em que FMS refere que no período do PREC iam “para a rua fazer a realidade”, em vez de ima para a rua “filmar a realidade”.

Bibliografia

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Filmografia

A Saída dos Operários da Fábrica Lumière, 1895. De Auguste e Louis Lumière.

O Eclipse, 1961, Michelangelo Antonioni.

Verão Coincidente. 1962. De António de Macedo.

As Palavras e os Fios. 1962. De Fernando Lopes.

Dom Roberto. 1962. De Ernesto de Sousa.

Verdes Anos, 1963, Paulo Rocha.

Acto de Primavera. 1963. De Manoel de Oliveira.

Belarmino. 1964. De Fernando Lopes.

Nicotaina. De António de Macedo.

Catembe. 1965. De Manuel Faria de Almeida.

As Ilhas Encantadas. 1965. De Carlos Vilardebó.

...E Era o Mar. 1966. De José Fonseca e Costa.

Cruzeiro do Sul. 1966. De Fernando Lopes.

Marionettes Inc. 1966. De Fernando Matos Silva.

Farenheit 451. 1966. François Truffaut.

A Matafísica dos Chocolates. De 1967. De José Fonseca e Costa.

Balas Para Selma. 1967. António de Macedo.

Regresso à Terra do Sol. 1967. De José Fonseca e Costa.

Tejo – Rota do Progresso. 1967. De Fernando Lopes.

Tejo – Na Rota do Progresso. 1967. De Fernando Matos Silva.

Alta Velocidade. 1967. De António de Macedo.

Crónica de um Esforço Perdido. 1967. António de Macedo.

Albufeira. 1968. De António de Macedo.

A Cidade. 1968. De José Fonseca a Costa.

Uma Abelha na Chuva. 1971. De Fernando Lopes.

O Mal-Amado. 1974. De Fernando Matos Silva.

As Armas e o Povo. 1975. Filme coletivo.

Crónica dos Bons Malandros. 1984. De Fernando Lopes.