Capítulo / Chapter II | Cinema – Cinema

Bridging Education and Industry: The Role of Experimental Agencies in Brazilian University Cinema

Da Formação ao Mercado: O Papel da Agência Experimental no Cinema Universitário Brasileiro

Francisco Malta

UNESA, IBMEC, PUC/RJ, Brasil.

Nívea Faso

UNESA, UniFacha, UCL, Brasil.

Wilson Oliveira Filho

UNESA, PPGCINE/UFF, Brasil e Yale University, EUA

Abstract

The film and audiovisual programs increasingly seem to recognize the importance of their role not only in preparing students for the future job market, but also in consolidating a niche of productions that strengthen and solidify the Brazilian film industry. This article aims to present, reflect on, and propose new possibilities for the experimental agency of the Cinema and Audiovisual program (Agecine) at Estácio de Sá University. Comparisons with other university-based production companies are necessary, but this is not about competition—rather, it is about exploring how different practices lead to diverse possibilities for university filmmaking. Successful examples are also necessary. It is also important to consider how the agency complements and enhances the department that previously managed the program’s productions, the Cinema Center (Nucine). Through an analysis of the films and events produced by the Cinema and Audiovisual program at UNESA, this article can help us understand how university cinema in Brazil faces its challenges in building a cinema yet to come.

Keywords: Film production; College cinema; Cinema agency.

“Quando vejo um rio, não vou de cara em cima dele.
Escondo-me, esperando a hora certa.
Há certas coisas na natureza que se você não filma na hora certa, nunca mais filmará.
O vento é plástico, bom para não parecer fotografia.
Natureza a gente não deve filmar quando a gente quer, mas na hora que a natureza escolhe…”
(Humberto Mauro)

Introdução

Marshall McLuhan, em um de seus aforismos, chama o cinema de “sala de aula sem paredes” (McLuhan, 2002). Com seu estilo e na crença midiática que tão bem lhe renderam elogios de estudiosos da educação, o teórico canadense foi um dos primeiros a inverter a ideia importante de se levar filmes para sala de aula. Por não ter paredes, seu pensamento para a mídia e para a educação pressupunha que filmes saíssem das salas de aula. Sua provocação era, em suma, maior: estudantes poderiam e deveriam fazer cinema. McLuhan não compactuava com a ideia de que, por estarmos em uma sociedade que vê o cinema como espetáculo, o cinema deveria invadir as salas de aula somente pela exibição de filmes. Rosália Duarte, ampliando essa concepção, observa que nós, professores, fazemos “uso dos filmes apenas como recurso didático de segunda ordem, ou seja, para “ilustrar”, de forma lúdica e atraente, o saber que acreditamos estar contido em fontes mais confiáveis” (DUARTE, 2009, pp.70-71). Essas fontes remetem a obscura epígrafe que abre esse texto. De que natureza nos fala Mauro, da natureza em si, ou dessa segunda natureza, o próprio cinema?

Esse uso instrumental do cinema que pode até fazer sentido para outros cursos, mas não nos parece mais suficiente para a literacia midiática porvir ou, simplesmente, para os novos egressos e egressas que já chegam nos cursos de cinema e audiovisual com participações no IMDB, são ativos no Letterbox e que frequentam a cinefilia reerguida em cidades como o Rio de Janeiro através de fenômenos urbanos como uma nova geração do Cine estação - projeto capitaneado por Cavi Borges, ex-aluno do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estácio de Sá (UNESA) no Rio de Janeiro - ou os seguidos eventos na Cinemateca do Museu de arte Moderna do Rio de Janeiro com curadoria de Ruy Gardnier. Como bem registrou Filipe Furtado em seu texto “História espectral do cinema brasileiro” (2005), mesmo com a extinção da Embrafilme, a produção brasileira não vai a zero como muitos apontam. Restam os fantasmas, o que foi idealizado e muito do que então ficou é a produção amadora e universitária.

Se, enigmaticamente, como observou o crítico francês Serge Daney, gerações futuras conheceriam o cinema com sua falta, os esforços citados anteriormente ganham um novo aliado para que, mesmo com os espaços de cinema se metamorfoseando1, não se perca de vez a experiência da sala escura e seu trânsito saudável com a educação. Trata-se da produção universitária organizada. Não há dúvidas do valor e do papel dos cursos de cinema para o mercado audiovisual desde os anos 1960 no Brasil. O pioneirismo dos cursos na Universidade de Brasília (UNB) e na Universidade Federal Fluminense (UFF) é histórico e necessita ser cada vez mais celebrado. A preocupação do cineasta brasileiro Nelson Pereira dos Santos em montar esses cursos e ensinar cinema colheu muitos frutos não só na academia, mas nas produções brasileiras. Agradecemos a Nelson e vamos adiante. Hoje, a UFF conta com um departamento mais organizado para a produção de seus filmes e circulação do cinema feito pelos estudantes. A incubadora de projetos audiovisuais Araci e a ilha de edição remota (IER) são dois projetos inovadores2 que mostram como essa universidade pública se organizou para atender as produções dos alunos e as demandas de um audiovisual do futuro.

Como docentes de Cinema nossa preocupação neste artigo é adicionar algo que extrapola a estrutura departamental das universidades públicas nos cursos da área, articulando como a produção universitária atualmente passeia pelo universo de realização e lançamentos de filmes no mercado audiovisual. Em particular, nosso objetivo aqui é apresentar a Agência de Cinema (Agecine) da Universidade Estácio de Sá no Rio de Janeiro, mais particularmente ainda no campus Maracanã da Instituição. Uma agência de produção dentro dos cursos aponta para como essa função fundadora do fazer fílmico, a produção, pode alavancar o mercado de curtas-metragens, por exemplo, além de contribuir de forma decisiva para o futuro do cinema no Brasil.

O ensino de cinema na graduação revela, antes de tudo, uma prática pedagógica complexa, que atravessa a criação, a técnica e o pensamento crítico. Não se trata de capacitar os estudantes no uso de ferramentas audiovisuais, mas de construir um ambiente de formação onde se pense o cinema como linguagem e como gesto. Ensinar (e aprender) cinema é, em grande medida, lidar com o sensível, com aquilo que se dá no tempo da escuta, no espaço colaborativo e nas escolhas que constroem uma narrativa.

Nesse contexto, formar em cinema vai além de preparar profissionais para um mercado em constante transformação. Trata-se de fomentar modos de ver, de escutar e de narrar que carreguem potência crítica e sensibilidade estética diante do mundo. A universidade, nesse sentido, não pode se limitar a um conjunto de disciplinas técnicas ou teóricas; ela precisa abrir espaço para a experiência, para o erro e para o improviso. Mas, sobretudo, para a reflexão sobre o próprio fazer. É nesse ponto que práticas como a das agências de cinema ganham relevância: elas criam um ambiente em que o processo é tão importante quanto o produto final, e onde o estudante é chamado a tomar decisões, assumir responsabilidades e experimentar a linguagem audiovisual com liberdade e estrutura ao mesmo tempo. Que práticas de ensino, afinal, conseguem hoje sustentar esse tipo de formação sem cair na reprodução de fórmulas esvaziadas? Talvez sejam justamente aquelas que se aproximam da prática viva, colaborativa e aberta ao risco - como se propõe nas experiências de produção universitária articuladas por agências.

CEP e Nucine, ou antes da Agecine

O Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estácio de Sá nasceu como uma graduação tecnológica no final dos anos 1990 no campus João Uchoa da Universidade. Inicialmente coordenado por André Di Mauro, sobrinho-neto do cineasta Humberto Mauro, o curso seguia a vocação educacional desse pioneiro de Volta Grande e integrante vital do INCE3 que afirmava que o cinema é cachoeira. Ao se tornar um Bacharelado pleno nos primeiros anos do século XXI, o curso começou a se preocupar com os filmes produzidos pelos alunos, oferecendo a esses o suporte através da CEP, Central Estácio de Produção. A docente Márcia Bessa era responsável pelo gerenciamento dos projetos acadêmicos audiovisuais dos alunos do Curso Superior de Cinema entre 2002 e 2007. Filmes como “Darcy, pensador do Brasil” (Edson de Souza, 2004) e Homens pequenos no ocaso projetam grandes sombras de Tim Gerlach (2003) são alguns dos e pioneiros entre algumas centenas de filmes realizados pelo curso de Cinema e Audiovisual com apoio da CEP e do Nucine, que seguiu durante os anos seguintes a distribuir os filmes produzidos pela instituição.

O Nucine, Núcleo de Cinema da Universidade Estácio de Sá, é a extensão da CEP, criado para um novo currículo que demandava mais atenção ainda a todos os produtos audiovisuais confeccionados por estudantes nas duas unidades que ancoram o curso de Cinema e Audiovisual. Egressa4 do curso, Cátia Castilho por mais de 20 anos foi a responsável pelo setor, garantindo a distribuição dos filmes. A equipe do Nucine tentava abraçar todo e qualquer projeto de realização fílmica e foi vital para a afirmação desse curso pioneiro no Brasil.

O caso de sucesso de “Um jardim Singular”

O estímulo à criação autoral sempre esteve no cerne das práticas pedagógicas e institucionais que envolvem a formação audiovisual, sendo incentivado de forma contínua ao longo dos anos. Um exemplo emblemático desse compromisso foi o Edital Elipse, em 2017, que viabilizou o documentário Ensaio: Um Jardim Singular 5. Esse projeto revelou não apenas a potência estética e narrativa dos alunos envolvidos, mas também consolidou um modelo de produção que valoriza a escuta sensível, a experimentação formal e o olhar poético sobre o cotidiano. Ao fomentar iniciativas como essa, a instituição reafirma seu papel como espaço fértil para o exercício da autoria, abrindo caminhos para a autonomia criativa e para a articulação entre o fazer artístico e a reflexão crítica.

A transdisciplinaridade, ancorada nos princípios da complexidade, na multiplicidade dos níveis de realidade e na lógica do terceiro incluído, pode se expressar por meio das instâncias institucionais, da atuação docente e da experiência discente. O caso aqui relatado emerge da perspectiva do professor-orientador Francisco Malta, a partir da prática desenvolvida por quatro estudantes do curso de Cinema e Audiovisual — Monica Klemz, Ricardo Aleixo, Ricardo Bento e Thiago Simas — no contexto de um projeto que exemplifica o entrelaçamento de competências diversas e estruturas cognitivas distintas. Essa articulação amplia as possibilidades perceptivas e operacionais ao explorar múltiplas formas de ver, escutar e interagir com o mundo, potencializando espaços de encontro, colaboração, criação e autoria no âmbito da produção audiovisual universitária.

Essa reflexão, alimentada pela interlocução entre professor e estudantes, também reconhece a contribuição ativa de outros três docentes — Denise Trindade, Guilherme Lima e Wilson Oliveira Filho — cuja mediação proporcionou a contextualização dos saberes e a formação de equipes colaborativas. Tais grupos, ao operarem sob um mesmo propósito, organizaram-se com base em princípios que contemplam a complexidade do fazer audiovisual, onde teoria, prática, experiência sensível, ética, responsabilidade coletiva e a convivência com a alteridade se entrecruzam como estratégias de enfrentamento e resolução de desafios criativos.

A Agecine e a pedagogia do fazer na universidade

Se o cinema é, como nos diz Gilles Deleuze, uma forma de pensamento que não opera por conceitos, mas por blocos de movimento e duração, então uma agência universitária de produção audiovisual não pode ser vista apenas como um repositório técnico ou um suporte funcional. Trata-se, antes, de um território de invenção sensível; um lugar onde o pensamento se faz gesto, luz, som, montagem. Em O ato de criação (1999), Deleuze adverte: “ter uma ideia em cinema” não é o mesmo que tê-la em filosofia ou literatura; é uma ideia que se realiza nas imagens em movimento, no tempo manipulado, no espaço construído pelo olhar. É nesse campo de forças que se inscreve a proposta da Agecine, do curso de Cinema e Produção Audiovisual na Universidade Estácio de Sá – Maracanã, onde a agência experimental opera menos como prestadora de serviços e mais como disparadora de experiências. A função da Agecine não se limita a operacionalizar gravações ou fornecer suporte técnico aos alunos; ela é os próprios alunos. Estruturada como uma incubadora de ideias, a agência é protagonizada por estudantes que concebem, executam e respondem integralmente por suas criações. O termo “incubadora” aqui deve ser entendido em seu sentido mais pleno: um espaço contínuo de desenvolvimento de projetos em audiovisual, de amadurecimento conceitual e de construção coletiva do saber-fazer cinematográfico. Não se trata de um laboratório efêmero ou de um rito de passagem institucional, mas de um lugar de permanência criativa, onde a experimentação é constante e o erro é compreendido como etapa de formação. Ao valorizar o processo tanto quanto o produto, o fazer cinematográfico se consolida como forma de pensamento em ação - aprender a filmar nesse contexto, é também aprender a criar mundos possíveis com imagens em movimento.

A Agecine conta com a orientação de um professor mentor, responsável por acompanhar os projetos e estimular o desenvolvimento técnico e criativo dos alunos. Esse acompanhamento ocorre de forma democrática e participativa, refletindo os princípios da instituição. Para ingressar na agência, é aberto um processo seletivo transparente, no qual os estudantes se inscrevem voluntariamente. Após essa etapa, cada participante é direcionado à função que mais se adequa ao seu perfil, interesse e potencial de contribuição, favorecendo um ambiente de trabalho colaborativo, comprometido com a formação integral e a autonomia criativa dos envolvidos. Desde 2021, há uma tentativa contínua de consolidação da Agecine Maracanã que, em 2020, iniciava suas atividades ainda no campus João Uchôa, mas os esforços iniciais enfrentaram entraves institucionais locais marcados por uma lógica pouco pedagógica e, muitas vezes, excessivamente burocrática, que buscava aferir resultados com base em métricas rígidas e descoladas do princípio formativo. Em 2023/1, sob a coordenação da professora Adelaide Chao, houve um importante avanço na incorporação de fundamentos pedagógicos à condução da agência, embora ainda limitados pelas exigências administrativas de resultados e quantificáveis. A transformação mais significativa ocorreu em 2024, com a chegada da professora Gisele Barreto como líder nacional das agências. Sua trajetória como docente e coordenadora conferiu legitimidade institucional ao projeto e possibilitou maior liberdade para o protagonismo estudantil. No campus Maracanã, sob a coordenação da professora Nívea Faria de Souza (desde o segundo semestre de 2023), a agência passou a priorizar os processos formativos, compreendendo o produto como desdobramento natural da prática colaborativa. Com o apoio de Gisele, fortaleceu-se também a articulação entre os campi Maracanã e Tom Jobim, ambos no Rio de Janeiro; ampliaram-se parcerias e intensificaram-se as trocas com outras agências universitárias do país, por meio de encontros online. O foco deslocou-se do controle para o compartilhamento, reafirmando o audiovisual como prática formativa, relacional e coletiva.

O cinema não se aprende apenas com leituras e debates em sala de aula - limitar-se a isso é ignorar sua natureza profundamente técnica, colaborativa e processual. O audiovisual se aprende também no set, na manipulação da câmera, na escuta dos sons, na adequação da luz e com os enquadramentos. Reconhecendo essa dimensão prática e relacional, a iniciativa da Agecine busca reposicionar o aluno não como aprendiz, mas como profissional em formação contínua, atuante em projetos com prazos, entregas e articulação de equipes - todas as dimensões fundamentais da realidade audiovisual brasileira. Cada proposta submetida segue um cronograma trimestral, com etapas de conceituação, preparação, pré-produção, produção e pós-produção. Exequibilidade, autoria discente e vínculo comunitário constituem os critérios estruturantes de uma liberdade formativa construída na prática, situada no coletivo e sustentada pela responsabilidade. Esse vínculo com a comunidade, aliás, não é um detalhe, mas uma diretriz em consonância com as orientações recentes do Ministério da Educação sobre a extensão universitária e sua necessária articulação com a participação social (MEC, 2025). É nesse sentido que a Agecine se diferencia de um laboratório técnico convencional: ela integra a lógica da extensão e propõe ações como oficinas abertas ao público, produção de documentários com foco social e cobertura audiovisual de eventos externos. Alguns exemplos recentes ilustram bem essa prática: a cobertura do ensaio técnico da Escola de Samba Mirim Nova Geração Estácio de Sá (2025) e a parceria com o curso de Arquitetura para o acompanhamento documental da reforma do Abrigo Teresa de Jesus (2024) que fica a 350 metros da instituição de ensino sede da agência. Cada projeto ativa uma rede de cooperação entre cursos, professores e comunidade envolvida, estimulando o pensamento transversal e o audiovisual como vetor de cidadania.

Nesse circuito, a coordenação da agência desempenha um papel importante, não como instância de controle, mas como mediadora formativa. Em vez de operar sob a lógica hierárquica tradicional, onde o professor dirige e os alunos executam, adota-se aqui um modelo horizontalizado de orientação, no qual o coordenador atua como facilitador de processos criativos, impulsionador de propostas e articulador pedagógico. A escuta ativa, a construção de cronogramas realistas e a mediação entre desejo artístico e condições objetivas de produção são centrais nessa dinâmica. Mais do que avaliar resultados, acompanha-se o percurso: o desenvolvimento das competências técnicas, éticas e colaborativas dos discentes se dá no fazer, e é nesse fazer que se constrói também a liberdade criadora.

No entanto, agir sob a liberdade criadora não é excluir a organização, pelo contrário, é compreender que a forma também educa o gesto. No contexto da Agecine, práticas de gestão de projetos surgem como ferramentas de realização, com objetivos, plano de ação, prazos, cronograma, cadeia de responsabilidades e avaliação de resultados e alcance são inseridos no cotidiano da produção, aproximando da realidade profissional onde a criação se articula a estruturas viáveis. A mediação institucional também faz parte do gesto pedagógico. A coordenação ocupa-se de articular a agência com outros cursos, setores e parceiros externos, compondo redes que sustentam o fazer audiovisual como prática ampliada. É nesse vaivém entre dentro e fora que emergem projetos interdisciplinares, como os realizados em parceria com os cursos de Arquitetura e Gastronomia - a exemplo do Projeto Garfo - ou com a comunidade, como o realizado com a Escola Estadual de Teatro Martins Penna (Rio de Janeiro, 2024), cujas trocas evidenciam o potencial formativo do encontro entre linguagens. Essas iniciativas só se concretizam porque há uma escuta atenta às demandas dos estudantes e uma costura cuidadosa entre liberdade criativa e viabilidade institucional. Nesse ponto, as coordenações da agência e do curso de Cinema atuam como pontes vivas entre a universidade e o território, fazendo do audiovisual não apenas um campo de expressão, mas também uma ferramenta de cidadania, formação política e engajamento cultural. A função coordenativa, portanto, não se limita à administração de prazos e métricas de alcance, mas se afirma como prática estratégica de cuidado, escuta e articulação. Ao fomentar o protagonismo discente e garantir que os processos sejam acompanhados, documentados e compartilhados, a agência converte cada percurso em um campo fértil de criação e pensamento, onde fazer e formar caminham juntos, e a experiência ganha dimensão coletiva.

O Projeto Pedagógico do Curso de Cinema e Audiovisual foi concebido a partir de uma escuta atenta às transformações culturais, tecnológicas e comportamentais que impactam diretamente a formação acadêmica no século XXI. Estruturado sob princípios interdisciplinares e metodologias ativas, ele busca articular teoria e prática de forma contínua e integrada, promovendo uma aprendizagem significativa, centrada no protagonismo do estudante. A proposta reconhece o audiovisual como linguagem e ferramenta crítica de intervenção no mundo, priorizando uma formação humanista, ética, reflexiva e comprometida com a transformação social.

Nesse contexto, a coordenação do curso exerce um papel central como mediadora entre as diretrizes institucionais e as necessidades concretas da comunidade acadêmica. Atuando de forma horizontal e democrática, a coordenação se propõe a ouvir alunos e professores, avaliar demandas, propor soluções e criar estratégias que favoreçam um ambiente de ensino-aprendizagem dinâmico, inclusivo e criativo. Ela não apenas supervisiona o cumprimento do currículo, mas também estimula práticas pedagógicas inovadoras e interações entre diferentes áreas do saber, fortalecendo o vínculo entre formação acadêmica e mercado de trabalho.

A relação entre o projeto pedagógico e a coordenação se manifesta, sobretudo, na promoção de espaços de escuta, diálogo e coautoria. Projetos como a Agência Experimental de Cinema e Audiovisual (Agecine), os Trabalhos de Conclusão de Curso, as produções coletivas, Iniciação Científica e os grupos de pesquisa e extensão são permanentemente acompanhados e incentivados pela coordenação, que compreende a importância da vivência prática como eixo estruturante da formação. A coordenação atua, assim, como um elo articulador entre o planejamento pedagógico e a execução cotidiana do curso, garantindo a coerência entre princípios e ações.

Além disso, a coordenação tem investido na formação continuada do corpo docente e na atualização do currículo, assegurando que as competências exigidas pelo campo profissional estejam alinhadas às demandas emergentes da indústria audiovisual e às transformações tecnológicas e culturais. A interlocução com outros cursos, setores da instituição e parceiros externos também integra a atuação da coordenação, ampliando o repertório de experiências formativas e oferecendo aos estudantes oportunidades de vivência interdisciplinar e inserção em redes colaborativas.

O curso de Cinema e Audiovisual, orientado por seu projeto pedagógico, vai além da simples transmissão de conteúdos: ele convida à escuta sensível do mundo, ao olhar atento para as narrativas diversas e ao exercício da imaginação crítica.

Mais ainda, o projeto pedagógico e a atuação da Agecine respondem diretamente às novas demandas do mercado audiovisual, que requerão profissionais capazes de operar em contextos multiculturais, sensíveis às pautas identitárias e atentos à representatividade na tela e atrás das câmeras. Nesse sentido, o curso estimula a incorporação de temáticas como gênero, raça, diversidade sexual e culturas periféricas nas produções estudantis, promovendo laboratórios e festivais internos que celebram narrativas diversas. A Agecine, como ambiente de aplicação prática, oferece aos alunos a oportunidade de desenvolver projetos que dialogam com essas demandas, seja por meio de documentários comunitários, ficções protagonizadas por vozes historicamente marginalizadas ou campanhas institucionais comprometidas com a equidade.

O respeito às diferenças, farol orientador tanto do currículo quanto das atividades da Agecine, materializa-se em políticas de inclusão e acessibilidade — legendagem e audiodescrição em produções, equipes multiculturais e ações formativas sobre leitura de cena e viés de representação. A coordenação, em parceria com a agência experimental, fomenta parcerias com coletivos e organizações sociais, garantindo que os projetos acadêmicos sejam concebidos e executados em diálogo com as comunidades retratadas. Assim, o curso forma cineastas e produtores que não apenas dominam técnicas e narrativas, mas também compreendem seu papel social, cultural e ético na construção de um audiovisual plural e transformador.

Conclusão

Setores responsáveis pelo acompanhamento das ideias de alunos e alunas dos cursos de Cinema se fazem cada vez mais necessários, levando-nos a uma dupla conclusão trivial: a produção universitária precisa se embasar em boas práticas que a própria história do cinema nos legou como o INCE aqui mencionado e as agências de Cinema são parte do futuro que a formação em Cinema e Audiovisual demanda.

A Agecine, ao promover experiências reais de produção e fomento à experimentação, consolida a autonomia e o protagonismo dos estudantes, incentivando-os a reconhecer a responsabilidade ética e cultural que lhes cabe. Assim, a instituição reafirma seu compromisso de formar cineastas e produtores engajados, capazes de construir narrativas plurais, inclusivas e transformadoras. Ao integrar metodologias ativas, práticas colaborativas e um olhar atento às pautas identitárias e às transformações do mercado, o curso prepara profissionais capazes de atuar com criatividade, visão crítica e respeito à diversidade.

A importância pedagógica da Agência Experimental no cinema universitário reside na sua capacidade de integrar prática mercadológica e formação, oferecendo aos estudantes a vivência concreta dos desafios e fluxos de uma produção audiovisual. Ao funcionar como espaço de criação, experimentação e tomada de decisão, a agência promove o desenvolvimento de competências técnicas e éticas fundamentais à atuação profissional. Mais do que preparar para o mercado, forma para o coletivo, para o inédito e para a escuta. Com isso, aproxima o estudante da realidade do setor e amplia sua consciência crítica sobre o papel social do cinema.

Notas Finais

1Tomemos como essa mudança no ambiente de exibição cinematográfico a arena em formato de domo MSG em Las Vegas. Para mais, ver Oliveira, 2024.INCE

2Liderados pelas professoras Eliane Ivo Barroso e Índia Mara Martins e uma equipe de alunos e pós-doutorandos como a egressa do curso de Cinema e Vídeo da UFF Márcia Bessa, que implementou a possibilidade de edição de filmes por parte dos alunos de forma remota.

3Instituto Nacional de Cinema Educativo, idealizado por Roquete Pinto. Humberto Mauro desenvolveu entre 1936 e 1964 mais de 300 documentários de curta-metragem voltados à educação para o povo brasileiro.

4O curso nasce no campus João Uchôa que em 2021 se torna Super Campus Maracanã em outro endereço e na unidade Tom Jobim.

5O curta dirigido pela egressa do curso Monica Klemz foi exibido no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MOMA) e recentemente no festival “Cinema e Natureza”, organizado por Wilson Oliveira Filho e Oksana Chefranova na Universidade de Yale.

Bibliografia

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