Abstract
This article examines the approach to LGBTQIAPN+ themes in films, analyzing how the representation of these issues has evolved over time and impacted audiences and the film industry. Through a critical review of the literature and an analysis of specific cases, we identify the predominant trends in the representation of LGBTQIAPN+ characters and narratives. The study highlights the importance of visibility and diversity in the media, exploring how films have addressed topics such as gender identity, sexual orientation, discrimination, and acceptance. Additionally, we discuss the challenges and resistances faced by filmmakers when including LGBTQIAPN+ themes, as well as the crucial role cinema plays in shaping social and cultural perceptions. As a corpus, the films analyzed include: “Philadelphia” (1993), “Milk” (2008), and “The Way He Looks” (2014). To foster the discussion, we draw on the works of Robert McKee (2006), Andrews (2024), and Sayad (2008).
Keywords: Cinema, Narrative, Representation, Film analysis, Society.
Introdução
Frequentemente, o cinema ilumina questões contemporâneas que ressoam na sociedade. Com o advento da internet e a proliferação das redes sociais, causas e pautas identitárias atingem grandes proporções, alcançando um público ávido por debate. Nos últimos anos, a causa LGBTQIAPN+ tem estado em destaque, conquistando novos direitos enquanto continua a clamar por outros. No contexto dessa causa, o cinema oferece uma contribuição inestimável ao fomentar a discussão, trazendo à tona vozes silenciadas e dando-lhes visibilidade.
Uma história nasce de uma ideia ou de uma situação de inquietação do escritor. Essa motivação acaba por direcionar a uma pergunta: o que você vai criar que o público jamais tenha visto? A pergunta é basicamente clichê, uma vez que todas as histórias, de alguma forma, já foram contadas. O que o escritor procura é imprimir seu recorte, seu olhar, seu posicionamento sobre determinado assunto ou fato. Quando nos deparamos com a proposta de contar uma história para o audiovisual, isso nos exige uma estrutura. Essa formatação tão específica é exclusiva da narrativa audiovisual.
A necessidade humana de ouvir e contar histórias atravessa séculos, mas obedece a um princípio: o registro. É o escrito que acompanha o homem desde os tempos das cavernas até os dias de hoje, com a convergência em diferentes mídias. O cinema surgiu como uma forma inovadora de contar uma história. Para tanto, a construção cinematográfica de uma trama pede um roteiro, objeto este escrito e posteriormente transformado para as telas. Ao pensar na escrita de um roteiro original, o principal objetivo é transformar palavras em imagens. Todo escrito será construído visando a um público de cinema, sendo essa a primeira etapa para a realização de um filme. O roteiro é o elemento chave para a produção e criação artística, portanto, toda construção cinematográfica que se pretende abordar no que tange à história surge por ele.
Diferente em sua criação, o roteiro cinematográfico não é considerado um texto literário, embora narre uma história, apresente personagens e diálogos. São diversos os elementos implicadores dessa vertente. Em comum com a literatura, o roteiro narra a história, descreve lugares e ambientes, mas difere da criação de um livro, pois não se preocupa com a expressão de uma língua, nem com figuras de linguagem, recursos estes destinados à literatura. Por outro lado, seu processo de escrita apresenta os efeitos visuais, indica trilha sonora, cortes, posição de câmera, elementos estes exclusivos do audiovisual.
A representação de personagens LGBTQ na sétima arte tem desempenhado um papel crucial na luta por direitos e reconhecimento. Filmes como “Filadélfia” (1993), “Milk, a Voz da Igualdade” (2008) e “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” (2014) não apenas entretêm, mas também educam e sensibilizam a sociedade sobre as questões enfrentadas pela comunidade Queer.
A linguagem cinematográfica possui um poder singular para abordar temas sensíveis na sociedade, como a causa LGBTQIAPN+. Por meio de narrativas visuais, o cinema transcende barreiras culturais e linguísticas, criando um espaço de empatia e reflexão. A representação de personagens e histórias gays nas telas não apenas visibiliza essa comunidade, mas também humaniza suas experiências, promovendo a compreensão e a aceitação.
A estética cinematográfica, com seu uso de símbolos, cores, e enquadramentos, intensifica as emoções e complexidades inerentes a essas narrativas, permitindo uma conexão mais profunda com o público. Em um mundo onde preconceitos ainda prevalecem, o cinema se revela um veículo poderoso para desafiar estigmas, educar audiências e fomentar diálogos necessários sobre diversidade e inclusão. Este artigo se propõe a trabalhar este recorte: Como o cinema contemporâneo tem se destacado como uma plataforma de debate e reflexão sobre as questões LGBTQIAPN+ e qual o impacto dessas representações na sociedade atual? Ainda como esses filmes retratam os avanços destes direitos e os conflitos sociais envolvidos em diferentes momentos do cinema.
As relações sexuais e a percepção da sexualidade variaram amplamente ao longo da história, influenciadas por fatores culturais, políticos e sociais. A Grécia Antiga e Roma oferecem exemplos significativos de como a sexualidade era vivida e entendida. Figuras históricas como Alexandre, o Grande, e Calígula são frequentemente citadas para ilustrar essas práticas e percepções. A pesquisa traça um panorama das relações sexuais desde a Grécia Antiga, destacando essas figuras icônicas retratadas no cinema.
A criação da narrativa
O termo “story” em inglês significa história, assim como “script” traduz-se como texto escrito, que inclui indicações e possíveis diálogos, um termo especialmente utilizado para televisão e cinema. Ambos servem ao propósito de apresentar uma história. Segundo Robert McKee, “uma regra diz: ‘você tem que fazer isso dessa maneira’. Um princípio diz: ‘isso funciona... E vem funcionando desde o início dos tempos.’” (MCKEE, 2006, p. 17). O principal objetivo do criador de uma narrativa deve ser contar uma história bem contada e que tenha algo a dizer que o público queira ouvir.
Mas como podemos situar essa estrutura do texto audiovisual para o signo linguístico? O texto-fonte (roteiro) é um registro. Isto é um fato. Esse fio narrativo possui seus verbetes escriturais, assim como um livro, um poema ou outro signo semântico. Para Barthes, “a semiótica é o estudo dos signos, podemos dizer que um signo é a junção do conceito e da palavra, ou seja, o signo é o significante e o significado” (BARTHES, 1988, p. 26). Em síntese, o signo passa a ser signo quando se define. O resultado do audiovisual nasce da condição do signo simbólico, dessa leitura que permite a transformação de um código a outro. É de suma importância atentar-se para o fato de que o escrito é sugerido, pois roteiro, como sua origem indica, pressupõe-se uma rota. A conclusão de um filme apresenta diferentes aspectos nos quais talvez o roteirista nem tenha pensado.
A câmera é capaz de fazer registros nem sempre planejados. É senso comum pensar que um roteiro pode indicar as imagens do filme para o leitor, mas isso aumentaria muito a responsabilidade do roteirista criador e deixaria o diretor cinematográfico numa condição de mero recriador de cenas, o que não é a proposta.
Seguindo a lógica, desde os tempos das fogueiras até os games, uma diversidade de histórias foi contada, cada uma a sua forma e a seu jeito, todas visando a entreter e deixar seu registro de uma geração para outra. Aristóteles (1984) nos deu os primeiros gêneros: lírico, épico e dramático, e ainda dividiu as unidades dramáticas em tempo, espaço e ação. O especialista americano em roteiro hollywoodiano, Robert McKee (2006), critica Aristóteles e afirma “que sua lucidez foi perdida, e os sistemas de gênero foram ficando cada vez mais obscuros e inflados” (MCKEE, 2006, p. 16). McKee sustenta-se nessa teoria.
Goethe listou sete tipos de acordo como assunto-amor, vingança, e por aí vai. Schiller argumentou que deveriam existir mais, mas não poderia nomeá-los. Polti apareceu com nada menos que três dúzias de gêneros, dos quais ele deduziu “Trinta e seis situações dramáticas”, mas suas categorias, como “Um crime involuntário cometido por amor” ou “Auto-sacrifício por um ideal”, são confusas demais para serem usadas. (MCKEE,2006, p.86)
Torna-se importante ressaltar que a estrutura de um roteiro permite momentos épicos, líricos ou dramáticos, desde que tenha uma unidade. Estudiosos buscam sempre entender a melhor forma de conquistar o público, que se torna cada vez mais sofisticado, deixando um desafio aos novos contadores de histórias. O que McKee não esclarece é que a combinação dos elementos desse novelo sempre resultará no enquadramento de Aristóteles.
Em sua obra “O roteiro de cinema,” Michel Chion (1989) exemplifica a qualidade literária dos roteiros de Eric Rohmer . Rohmer, diretor francês, foi responsável pela escrita e direção de seus filmes. O diretor sempre afirmou que escrevia seus textos primeiro como histórias, para posteriormente roteirizá-los. Nomes como Orson Welles, Godard, Truffaut, Almodóvar e Quentin Tarantino fizeram fama como diretores-roteiristas.
Ao explorar outro campo narrativo, o escritor tem como tarefa apresentar sua história. No campo do cinema, abre-se uma vasta possibilidade de atingir um público, algo altamente sedutor, especialmente com o advento da internet. A elaboração desse signo linguístico, que será transformado em outro código, visto as exigências do meio, atrai cada vez mais autores. A título de exemplificação, temos atualmente o escritor George R. R. Martin, responsável pelo livro “As Crônicas de Gelo e Fogo”, romance adaptado pela HBO como “Game of Thrones”. Por razões contratuais, a cada temporada, um episódio foi escrito pelo próprio autor.
O roteiro é uma ferramenta de suma importância, mas até o corte final, muitos outros elementos contribuem para contar essa história. Isso já o difere do romance, onde toda a construção e responsabilidade recaem no escritor da obra. Kaufman aponta que o termo autor de cinema “surgiu exatamente para chamar a atenção do público para o fato de que um filme é feito da orquestração de diversos elementos visuais e sonoros, e não da fidelidade a um texto - essa sim autoritária e limitativa” (KAUFMAN apud SAYAD, 2008, p.27). Esta perspectiva ressalta a importância da visão criativa do cineasta na composição cinematográfica, onde a interpretação e a manipulação dos componentes audiovisuais são essenciais para a expressão artística.
Primeiras Observações
Na Grécia Antiga, a sexualidade era integrada de maneira complexa à vida social e cultural. As relações homoeróticas, particularmente entre homens, eram comuns e até mesmo institucionalizadas em algumas cidades-estados, como Atenas e Esparta. A prática do pederastia (relacionamento erótico entre um homem adulto e um jovem adolescente) era socialmente aceitável e desempenhava um papel educativo e formativo.
Alexandre, o Grande (356-323 a.C.), é um exemplo notável da Grécia Antiga cujas relações pessoais são frequentemente discutidas em termos de sexualidade. Embora os detalhes de sua vida sexual sejam parcialmente especulativos, várias fontes históricas sugerem que ele teve relacionamentos íntimos com homens e mulheres.
Plutarco, em suas “Vidas Paralelas”, menciona Hephaestion, um dos generais mais próximos de Alexandre, como seu companheiro mais íntimo. Muitos historiadores modernos interpretam essa relação como sendo de natureza romântica ou sexual, embora os registros antigos sejam ambíguos sobre esses detalhes específicos. A bissexualidade, como vista através das lentes modernas, não era uma categoria distinta na Grécia Antiga; ao invés disso, a atração e os atos sexuais eram mais fluidos e contextuais.
Na Roma Antiga, as normas sexuais eram igualmente complexas, embora diferissem das gregas em vários aspectos. A sexualidade era frequentemente vista através do prisma do poder e do status. Relações entre homens eram aceitas desde que mantivessem uma hierarquia clara, onde o cidadão romano livre ocupava a posição dominante.
Calígula (12-41 d.C.), cujo nome verdadeiro era Gaius Julius Caesar Augustus Germanicus, foi um dos imperadores mais controversos de Roma, famoso por suas extravagâncias e excessos. Sua vida sexual é frequentemente destacada nas telas como exemplo dos excessos imperiais.
Suetônio, em sua obra “A Vida dos Doze Césares”, descreve Calígula como alguém que ultrapassou todas as normas sexuais de seu tempo. Ele era conhecido por seus casos tanto com homens quanto com mulheres e por sua prática de relações incestuosas com suas irmãs, o que chocava mesmo os padrões liberais romanos. Além disso, Calígula teria promovido orgias e outras práticas sexuais desenfreadas em sua corte, usando o sexo como uma ferramenta para afirmar seu poder e controle.
Influências Culturais
Tanto na Grécia quanto em Roma, a sexualidade era regulada por normas sociais e legais que refletiam os valores e a estrutura de poder da época. Na Grécia, a pederastia era parte de um sistema educacional e de mentorado, enquanto em Roma, as leis como a “Lex Scantinia” puniam a passividade sexual entre cidadãos livres para preservar a ordem social e a dignidade masculina.
Os avanços na compreensão da sexualidade foram influenciados pelos escritos de filósofos e médicos da época. Hipócrates e Galeno, por exemplo, abordaram a sexualidade e a reprodução em seus trabalhos, influenciando a medicina e a percepção cultural da sexualidade por séculos.
Os primeiros filmes que abordaram questões LGBTQIAPN+ desempenharam um papel crucial na quebra de tabus e na promoção da visibilidade e aceitação dessa comunidade. Essas obras pioneiras enfrentaram uma série de desafios e resistências sociais, mas abriram caminho para futuras produções explorarem de forma mais ampla e complexa as experiências gays. Ao retratar personagens e narrativas queer, esses filmes desafiaram as normas culturais e de gênero da época, provocando debates e discussões sobre identidade, amor, e sexualidade.
Ao colocar essas histórias na tela, esses filmes deram voz a indivíduos e comunidades marginalizadas, contribuindo para um movimento mais amplo em direção à igualdade e à representação diversificada no cinema. Embora muitos destas histórias possam ter sido recebidas com controvérsia e crítica, seu impacto duradouro é inegável, pois pavimentaram o caminho para uma maior inclusão e reconhecimento das experiências LGBTQIAPN+ na cultura cinematográfica e na sociedade em geral.
O cinema como veículo de debate
O cinema emergiu no final do século XIX em duas regiões do mundo: na França, através dos Irmãos Lumière, e nos Estados Unidos, pelas mãos de Thomas Edison. Desde então, personagens Queer eram representados nas telas – porém, não da maneira mais digna. Em ‘The Gay Brothers’ (1895), Edison elaborou uma narrativa extremamente breve, de apenas dezoito segundos, onde dois homens dançam ao som de um violino adicionado posteriormente, servindo mais como um alívio cômico do que qualquer outra coisa. Em 1923, Ralph Ceder dirigiu outra obra, trazendo Stan Laurel no papel de um gay efeminado, cujo enredo era centrado na mais “pura” comédia. A construção deste personagem era superficial e limitava a presença queer a tramas exclusivamente cômicas.
Segundo Fabio Silveira(2011), o primeiro beijo entre dois homens foi registrado no filme “Wings” de 1927, o qual foi o primeiro a receber o Oscar de Melhor Filme. Antes disso, insinuações de temática gay já podia ser observadas em filmes de Charlie Chaplin, como “Behind the Screen” (1916), ou em alguns curtas de Laurel e Hardy. Posteriormente, tais insinuações também apareceram em musicais, como “A Alegre Divorciada” (1934), estrelado por Fred Astaire e Ginger Rogers.
Na década de 1980 o destaque foi o filme “Filadélfia”, dirigido por Jonathan Demme e estrelado por Tom Hanks e Denzel Washington, foi um dos primeiros filmes de Hollywood a abordar o tema do HIV/AIDS e a discriminação contra pessoas LGBTQ, em 1993. A história gira em torno de Andrew Beckett (Hanks), um advogado gay que é demitido de seu emprego após seus empregadores descobrirem que ele tem AIDS. Ele então processa a empresa por discriminação.
A importância de “Filadélfia” reside na sua capacidade de humanizar uma crise de saúde devastadora e trazer à luz a discriminação sistêmica enfrentada por pessoas LGBTQIAPN+. Em uma época em que a AIDS era amplamente estigmatizada, o filme ajudou a mudar percepções e aumentar a empatia.
No contexto jurídico, o filme destaca questões relacionadas à discriminação no ambiente de trabalho. O caso real que inspirou o filme, Bowers v. Hardwick (1986), mostra o conflito judicial em relação aos direitos LGBTQIAPN+, onde a Suprema Corte dos EUA inicialmente manteve a criminalização da sodomia. Contudo, essa decisão foi posteriormente revisada em Lawrence v. Texas (2003), onde a Suprema Corte declarou inconstitucionais as leis que criminalizavam a conduta sexual consensual entre adultos do mesmo sexo.
“Milk, a Voz da Igualdade”, dirigido por Gus Van Sant, é uma cinebiografia de Harvey Milk, o primeiro político abertamente gay a ser eleito para um cargo público na Califórnia. O filme, estrelado por Sean Penn, traça a jornada de Milk desde sua chegada em San Francisco até seu assassinato em 1978, destacando suas lutas e conquistas como ativista dos direitos LGBTQIAPN+.
Harvey Milk é frequentemente lembrado por suas palavras inspiradoras: “Se uma bala entrar no meu cérebro, deixe essa bala destruir cada porta de armário”. Esta citação simboliza seu desejo de incentivar outras pessoas LGBTQIAPN+ a se assumirem e lutarem por seus direitos. No âmbito jurídico, a luta de Milk é emblemática para a legislação antidiscriminatória. Em 1977, Milk ajudou a derrotar a Proposição 6 da Califórnia, que buscava proibir gays e lésbicas de trabalharem em escolas públicas. Este foi um marco importante na proteção dos direitos civis de pessoas LGBTQIAPN+ e abriu caminho para futuras legislações, como a Lei de Não Discriminação no Emprego (ENDA), embora esta ainda não tenha sido totalmente aprovada a nível federal nos EUA.
“Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”(2014), dirigido por Daniel Ribeiro, é um filme brasileiro que conta a história de Leonardo, um adolescente cego que explora sua sexualidade e independência. A narrativa se distingue por sua abordagem sensível e natural do romance entre dois jovens rapazes, sem recorrer a estereótipos ou tragédias.
O filme foi um marco no cinema brasileiro, ao apresentar uma história LGBTQIAPN+ de maneira acessível e positiva. A obra reflete os avanços dos direitos LGBTQIAPN+ no Brasil, que, embora tenha legalizado o casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2013 pelo Conselho Nacional de Justiça, ainda enfrenta desafios como a violência e a discriminação contra a comunidade LGBTQIAPN+. Juridicamente, o filme ressoa com a decisão do Supremo Tribunal Federal do Brasil em 2011, que reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo, um avanço significativo para a igualdade de direitos no país.
Para Robert Mckee (2010), a melhor forma de revelar um personagem é na pressão, seja no documentário ou na ficção. Os documentários também significam ou representam os interesses de outros. “Paris is Burning ,(1991)” é uma obra cinematográfica fascinante que oferece uma visão íntima e comovente da cultura drag ball em Nova York durante os anos 1980. O filme mergulha profundamente na comunidade LGBTQIAPN+ marginalizada, destacando não apenas a arte do voguing e a extravagância dos desfiles, mas também os desafios enfrentados pelos membros dessa comunidade em uma sociedade que muitas vezes os rejeita. Bill Nichols explica:
Documentários que tratam de política de identidade também tratam da questão de alianças e afinidades entre várias subculturas, grupos e movimentos. Isso representa outra mudança da construção anterior de identidades nacionais para o reconhecimento de identidades parciais ou híbridas que raramente se encaixam em uma categoria única, permanente. (NICHOLS, 2016, p.242).
Uma das maiores forças do filme é a sua autenticidade e honestidade. Os participantes são apresentados de forma crua e realista, compartilhando suas histórias pessoais, aspirações e lutas. É uma celebração da diversidade e da resiliência humana, ao mesmo tempo que lança luz sobre questões sociais profundas, como racismo, homofobia e pobreza.
“Paris is Burning” é uma obra de arte cinematográfica impressionante. A direção habilidosa de Jennie Livingston e a edição cuidadosa criam uma experiência visualmente envolvente que cativa o espectador do início ao fim. A proposta pensada na linha documental se aproximou do jornalismo em seu caráter informativo, ao tentar trazer detalhes esclarecedores a respeito do universo Queer. A metodologia se apoiou nas técnicas de Nichols:
Essa ideia comum refere-se ao poder dos documentários de contar histórias. Eles nos falam do que conduz a acontecimentos ou mudanças reais, sejam experiências de um só individuo ou de uma sociedade inteira. Os documentários nos falam da maneira como as coisas mudam e de quem produz essas mudanças (NICHOLS, 2016, p.34).
Se o documentário herda o caráter informativo do jornalismo, por outro lado, ele traz a subjetividade que é inerente ao cinema. As escolhas das cenas, dos enquadramentos, dos personagens, da fotografia e do som são definidas a partir de um olhar para construção na narrativa, o que por si já define um direcionamento. Há uma discussão em jogo nesta assertiva: de quem é a história? Do cineasta ou das pessoas que ele filma?
Nichols mais uma vez nos ajuda a entender este paradoxo, ao afirmar que “uma vez que um documentário conta uma história, essa história é uma representação plausível do que aconteceu, não uma interpretação imaginativa do que poderia ter acontecido” (NICHOLS, 2016, p.34). Esta observação enfatiza a distinção crucial entre documentário e ficção, sublinhando que o documentário se compromete com a verossimilhança e a factualidade, enquanto a ficção se permite explorar possibilidades imaginativas e criativas.
Neste pensamento proposto por Nichols, o “tratamento criativo da realidade” permite que o “tratamento” inclua a narração de histórias, mas essas histórias devem atender a alguns critérios para que possamos qualificá-los como documentários. Essa linha tênue que transita entre documentário e ficção vai trazer para a discussão o quanto de invenção o cineasta trouxe para a história. O que é sua criação e o que são os fatos relatados? A narrativa de um documentário corresponde principalmente a situações, acontecimentos e pessoas reais.
Na elaboração do argumento, a obra Roteiro de documentário: da pré-produção à pós-produção, de Sergio Puccini (2009), foi utilizada como base. O autor orienta que, tal como o processo de investigação no jornalismo, devemos fazer as mesmas perguntas do Lead na construção do argumento. São as perguntas clássicas:
O quê? Diz respeito ao assunto do documentário, seu desenvolvimento, sua curva dramática. Quem? Especifica os personagens desse documentário, além de estabelecer os papéis de cada um deles. Quando? Trata do tempo histórico do assunto abordado. Onde? Especifica locações da filmagem. Como? Especifica a maneira como o assunto será abordado. Por quê? Trata da justificativa para realização do documentário (PUCCINI, 2009, p.37).
O ponto de vista em um filme costuma ser o do personagem principal, mas assim como a literatura, os filmes também podem assumir outros pontos de vista para aguçar as percepções do espectador. Do mesmo modo, documentar pressupõe por si um recorte. Este recorte acresce uma nova dimensão ao olhar lançado sobre a causa Queer. Os dispositivos de imagens, luz e som fornecem registros de pessoas, lugares e acontecimentos com um grau maior de fidelidade. A linha mestra de investigação em um documentário desperta no público o desejo de saber, a descoberta do oculto, do mundo a ser decifrado, ou como salienta Bill Nichols (2016):
Nos melhores exemplos, transmitem uma lógica informativa, uma retórica persuasiva e uma poética comovente, que prometem informação e conhecimento, descobertas e conscientização. Os documentários propõem a seus públicos que a satisfação deste desejo de saber seja trabalho de ambos. (NICHOLS, 2016, p.60)
Se o documentário apresenta um discurso, este discurso se levanta na voz de seus personagens e o recorte se dá pela escolha de quem conduz a proposta narrativa. A maneira que vemos e percebemos a história decorre do jeito que o criador do filme quer falar sobre o assunto, afinal, o posicionamento da câmera para captar um plano pressupõe-se uma escolha.
Avanços e conflitos
Os filmes mencionados refletem não apenas as vitórias, mas também os desafios contínuos enfrentados pela comunidade LGBTQIAPN+. Desde a luta contra o estigma do HIV/AIDS em “Filadélfia”, passando pela militância política em “Milk”, até a celebração do amor jovem em “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”, o cinema tem sido um espelho e um catalisador para mudanças sociais.
Os avanços nos direitos LGBTQIAPN+, como o casamento igualitário e a proteção contra discriminação, têm sido significativos nas últimas décadas. No entanto, esses filmes também mostram que a luta está longe de terminar. A discriminação, a violência e a marginalização ainda são realidades para muitas pessoas LGBTQIAPN+ ao redor do mundo.
Conclusão
O estudo das temáticas LGBTQIAPN+ no cinema revela não apenas a evolução da representação da diversidade sexual e de gênero na tela, mas também a sua importância como ferramenta de fomento de discussões e ampliação de público. Ao abordar questões de identidade, amor, aceitação e luta por direitos, os filmes LGBTQIAPN+ desafiam normas sociais e culturais, promovendo a reflexão e o diálogo sobre temas essenciais para a compreensão da complexidade humana.
As práticas e percepções da sexualidade na Grécia e Roma antigas oferecem uma visão rica e complexa de como as sociedades antigas lidavam com o desejo, o poder e as relações pessoais. Figuras como Alexandre, o Grande, e Calígula exemplificam os extremos dessas culturas, mostrando tanto a aceitação como a transgressão das normas sexuais de suas respectivas épocas. Ao estudar essas figuras e suas culturas, ganhamos uma compreensão mais profunda de como a sexualidade evoluiu e influenciou a sociedade ao longo da história.
A inclusão de histórias LGBTQIAPN+ nas produções cinematográficas não apenas aumenta a representatividade de grupos marginalizados, mas também atrai um público mais diversificado, ávido por narrativas autênticas e inclusivas. Esses filmes têm o poder de criar empatia, solidariedade e compreensão entre diferentes comunidades, contribuindo para a construção de uma sociedade mais tolerante e inclusiva.
Portanto, é fundamental reconhecer o papel crucial do cinema na promoção da diversidade e da igualdade, incentivando a produção e o consumo de filmes que celebrem a riqueza e a variedade das experiências humanas. Através dessas obras, podemos continuar avançando na direção de um mundo mais justo, respeitoso e acolhedor para todos.
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