Abstract
This article proposes a review of the ancient image medium, the magic lantern, created in the 17th century by Rasmussen Walgenstein (1609-1670), and mainly of the spectacles provided by this technique called phantasmagoria. Grau (2009) informs us that one of the most famous representatives of this first illusion industry was the Belgian Etienne Gaspard Robertson. The versatile illusionist exported the media of immersion to revolutionary Paris, and years later presented his show throughout Europe. Bahia and Bahia (2021) reveal that Robertson used the magic lantern technique to project supernatural beings, and in order to generate a greater emotional impact on the audience, he gradually increased the images, in addition to the use of sound effects. To discuss the importance of this ancient image medium for audiovisual, as well as for immersion arts, we selected the film The Illusionist (2006) directed and scripted by Neil Burger and the installation A Body of Water (1999) by Paul Sermon and Andrea Zapp. In the cinematographic work, the narrative develops from the shows of illusionist Eisenheim played by actor Edward Norton, who surprises the audience by managing to bring images of dead people to the stage. In the telepresence installation, the public can view images of dead mine workers. We can see in these two works, the representation of old phantasmagoria shows. To carry out this study, we used the theoretical contribution of the authors already mentioned, in addition to Arlindo Machado (2008), Laurent Mannoni (2003) and Nicole Koutsantonis (2021).
Keywords: Magic Lantern, Phantasmagoria, The Illusionist, A Body of Water, Immersive Art.
Introdução
A história do cinema não se inicia a partir da invenção do cinematógrafo pelos irmãos Auguste e Louis Lumiere, e a respectiva apresentação das imagens captadas em movimento para um seleto público em 1895 em Paris. Machado (1997) nos diz que se considerarmos o cinema como um sistema próprio de recursos expressivos, formado por duas partes distintas, onde a primeira se refere à sintetização do movimento e o rápido período de exibição das imagens fixas isoladas; e a segunda parte como a projeção dessas imagens em uma tela na cor branca posicionada no interior de uma sala escura, com o acompanhamento da específica sonoridade para um público, prontamente devemos considerar a inclusão dos antecessores dos Lumiere na prática de reprodução de imagens em movimento, como: os desenhos animados de longa-metragem do teatro óptico de Émile Reynaud no século XIX, a tradição da lanterna mágica iniciada no século XVII, e os espetáculos de fantasmagoria de Étienne-Gaspard Robert, conhecido por Robertson no final do século XVIII. Os precursores ingleses do cinema, Cecil Hepworth, Georges Albert Smith e James Williamson, começaram como lanternistas ou descendentes de lanternistas, esse fato pode explicar o desempenho singular dos iniciadores ingleses ao trabalhar de forma criativa com os elementos da retórica e da sintaxe cinematográfica em uma época antes da invenção do cinematógrafo. Atento a importância da técnica da lanterna mágica na história das imagens em movimento projetadas em uma sala escura, essa pesquisa busca evidenciar essa antiga mídia de imagem, bem como os espetáculos de fantasmagoria. Sendo assim, iniciamos a nossa reflexão teórica abordando o surgimento e o desenvolvimento da técnica da lanterna mágica e a sua prática nos espetáculos públicos. Na segunda parte do estudo, concentramo-nos no filme tcheco-estadunidense O Ilusionista (2006) de Neil Burger e a instalação realizada em três espaços na Alemanha, A body of Water (1999) de Paul Semon e Andrea Zapp destacando os pontos de semelhança entre essas duas obras a partir das características dos shows de fantasmagória. Buscamos o aporte teórico de Oliver Grau (2009), Arlindo Machado (1997), Laurent Mannoni (2003), Bahia e Bahia (2021) e Nicole Koutsantonis (2021) para compreendermos a importância da técnica das lanternas para o desenvolvimento do cinema.
A Lanterna Mágica e a sua funcão “sobrenatural” nos espetáculos de Fantasmagoria
Na história do surgimento da técnica cinematográfica percebemos que além das pesquisas científicas realizadas em laboratórios e os investimentos financeiros da indústria, o universo exótico conseguiu exercer uma grande influência nos pioneiros da prática da representação das imagens. Então, temos a influência do mediunismo, da fantasmagoria, dos espetáculos realizados em feiras, o teatro óptico de Reynaud, os fabricantes de brinquedos, além dos vários tipos de charlatães, conforme nos esclarece Machado (1997). Os historiadores de cinema interessavam-se em ressaltar os aspectos sociopolíticos particulares, privilegiando a invenção e os seus inventores, enfim, a história do cinema destaca a positividade técnica, as teorias científicas de percepção, e dos aparelhos que operavam a análise e síntese dos movimentos, e não vislumbravam o imaginário que eclodia do povo. Machado cita Bazin (1997) para reforçar que o discurso histórico do cinema reprimiu a experiência da sociedade com a representação do mundo dos sonhos e dos fantasmas. O imaginário e o excêntrico que constituem a força do movimento invisível que guia o cinema. A lanterna mágica foi umas das técnicas que surgiu como forma de expressar o mundo imaginário que habita a cultura popular. Bahia e Bahia (2021) nos informam que a lanterna mágica foi criada por Christian Huygens em 1660, mas coube ao jesuíta Athanasius Kircher o crédito dessa invenção, já que o mesmo foi o responsável pela primeira descrição desse equipamento, conforme a figura 1. Como também, os jesuitas contribuiram com a visibilidade da lanterna mágica através de apresentações em teatros e outros espaços.
Fonte: Bahia e Bahia (2021).História da Animação, Intersaberes.
Kircher descreveu essa técnica, ao informar o seu funcionamento como uma caixa escura. Há uma luz interna, que no início se originava de uma vela, e um tubo que possibilita a passagem desta. A luminosidade resultante atravessa um círculo de vidro, no qual há uma imagem pintada, ocorrendo então a projeção dessa imagem em uma tela. Na figura 1, temos a ilustração de Kircher, que nos possibilita compreender o mecanismo da lanterna mágica, a partir dela percebemos que a imagem projetada apresenta distintas posições de um esqueleto com uma foice, em cada versão os braços do esqueleto possui posições diferentes. Portanto, constatamos a movimentação em quadros nessa técnica. Grau (2009) acentua, que os jesuitas Athanasius Kircher e Gaspar Schott utilizavam a lanterna mágica com o objetivo de estimular o temor a Deus na sua plateia ao projetar a imagem do diabo na parede. Em relação às técnicas empregadas, estas apresentaram uma evolução mais a partir das tradições do século XVIII e se diferenciaram.
Aparatos de projeção como o fantascópio adquiriram mobilidade e se moviam silenciosamente sobre rodas de latão polido atrás de uma tela semitransparente (tanto a tela como o aparelho não eram visíveis ao público) de modo que as projeções pareciam se movimentar para perto e para longe. Além do mais, um filtro dissolver na frente da câmera tornou possível mudar abruptamente de uma cena para outra, de modo que se criava uma impressão sofisticada de movimento e diferentes atmosferas (Grau, 2009, p.248).
A lanterna mágica se popularizou nos séculos seguintes em toda a Europa, e foi utilizada em espetáculos de ilusionismo. Bahia e Bahia (2021) nos informam que 1798, o ilusionista Étienne- Gaspard Robert, conhecido como Robertson, aprimorou um espetáculo chamado de fantasmagoria. Robertson desenvolveu as técnicas utilizadas pelos seus antecessores, mas o que diferenciava das outras apresentações, era o aspecto sinistro dos shows que se assemelhava a uma espécie de “teatro de horrores”, ver a figura 2. Grau (2009) nos revela que os espetáculos de Robertson conseguiram um sucesso estrondoso na capital francesa, principalmente após as apresentações passarem a ser realizadas em um mosteiro capuchinho abandonado, no qual as pessoas para ter acesso ao espetáculo precisavam atravessar um cemitério.
Ele refinou as inovações técnicas de Philidor e aprimorou o repertório atmosférico de Enslen, oferecendo ao seu público visões voltairescas, a tentação de Santo Antônio e as três bruxas de Macbeth (Grau, 2009,p.248.).
Grau (2009) continua a nos explicar que Robertson, além de ter aprimorado as técnicas da lanterna mágica dos seus antecessores e inovar na narrativa dos seus espetáculos, também fabricava e comercializava a lanterna fantoscópica.
Fonte: Bahia e Bahia (2021). História da animação, Intersaberes.
Na penumbra da noite, o público atravessava o cemitério, percorria um longo e escuro corredor com quadros sombrios pregados nas paredes, até chegar ao “Salon de Physique”, um gabinete de mistérios, com atrações ópticas e sonoras, como espelhos de distorção.
Os espectadores estavam imersos em total escuridão, não havia primeiro plano, não havia segundo plano, não havia superfície, não havia distância, apenas uma escuridão esmagadora, impenetrável – “sublime escuridão”, nas palabras de Burke (Grau, 2009, p.250).
Quando o público sentava, podia escutar a voz de um comentarista que abordava a necessidade do “silêncio religioso”, cortado apenas pela sonoridade que incluia os sons de chuva, trovão e gaita de vidro. Esse instrumento propiciava uma trilha sonora que ampliava a atmosfera enigmática reforçando a imersão da plateia nas imagens representadas. Imersos na escuridão, as aparições se aproximavam das pessoas. Grau (2009) nos relata que em 1800, o escritor francês Grimond de la Reyniére opina a respeito dos espetáculos de fantasmagoria.
Com isso fica estabelecido que a ilusão está completa. A total escuridão da sala, a seleção de figuras, a mágica estonteante de seu crescimento verdadeiramente monstruoso, a mágica as acompanha - tudo está disposto de forma a impressionar a imaginação e conquistar todos os nossos sentidos (Grau, 2009,p.250).
A figura singular de Robertson não podia ser comparada aos charlatães da época, nem aos representantes da mágica imagística católica como Kircher, Della Porta, Schott e Zahn. Robertson se autodefine como criador de efeitos científicos. Mannoni (2003) nos informa que Robertson foi o mais importante e hábil projetista do seu tempo, inclusive superou o inventor da retroprojeção móvel, Paul Philidor.
Usurpou tudo de Philidor, mas fê-lo com uma tal ciência, uma tal mestria apaixonante, e de uma maneira tão durável (1798-1837) – quase quarenta anos de magia luminosa), que tem definitamente um papel mais brilhante na história do pré-cinema do que seu infeliz predecessor ( MANNONI, 2003, p.161).
Étienne-Gaspard Robert (1763-1837) nasceu em Liège, filho de um negociante chamado Jean Robert com Élisabeth Balace. Posteriormente aos estudos das humanidades com os oratorianos, ingressou e permaneceu brevemente na vida eclesiástica, desligando-se ao ser despertado pela vocação na pintura e na ciência física. Amigo de sábios como Villete e Henkart, em 1789 consegue publicar seu primeiro artigo sobre experiências elétricas. Foi aluno dos cursos de Brisson, de Charles, e através desses estudos compreende o poder das projeções luminosas sobre as massas. Em 1792, torna-se preceptor de filhos de famílias ilustres, época em que conhece a fantasmagoria de Philidor. Em Liège, tenta despertar o reconhecimento do mundo científico ao reconstruir a famosa experiência com o espelho de Arquimedes, sem obter sucesso, retorna então a Paris. Em 1797, torna-se professor de física e química na Escola Central do Departamento de Ourthe, porém permanece no cargo por apenas dois meses. Foi nessa época que acreditando ser um físico-filósofo cria o seu espetáculo de fantasmagoria. O primeiro espetáculo de fantasmagoria assinado por Robertson ocorreu em 23 de janeiro de 1798, e foi um sucesso de público. Entretanto, após a estréia da fantasmagoria, Robertson foi afastado do círculo dos verdadeiros cientistas.
Mannoni (2003) cita um trecho do jornal de Paris, de 23 de janeiro de 1799, para evidenciar como Robertson era visto: Como cientista, pintor, mecânico e óptico; possui todas as habilidades para trabalhar na produção dos grandes efeitos a partir dos sentidos; porém não deseja ser visto como mágico, necromante em uma época em que todos os truques se extinguem diante da razão humana. No entanto, com a estreia do espetáculo de fantasmagoria, Robertson é afastado do círculo dos cientistas, o qual fazia parte anteriormente. As tentativas de proporcionar através da fantasmagoria um curso de física experimental ou produzir uma denúncia filosófica do império do preconceito foram fracassadas.
Os parisienses iam ao Pavillion de l’Échiquier para se divertir, para sentir calafrios, não para serem instruídos. Robertson foi então obrigado a introduzir efeitos teatrais espetaculares, que ao atrair a massa, davam a seu autor uma reputação bastante ambígua. O cientista Robert, transformado no ilusionista Robertson, passara da ciência para o espetáculo, e, a partir daí, seus contemporâneos passaram a encará-lo como um quase charlatão, uma espécie de saboiano, ou, pior ainda, como um daqueles “cientistas recreativos” que entretinham o povo no Boulevard du Temple ou no Palais-Royal (Mannoni, 2003,p.165).
Robertson, ver figura 3, nunca renunciou ao seu título de cientista, apesar de não ser visto como ambicionava, conquistou fama e riqueza.
Fonte: Grau (2009).Arte, ciência e Tecnologia,Unesp.
Koutsantonis (2021) nos informa que assim como Robertson utilizou seus estudos acadêmicos para desenvolver as imagens fantasmagóricas, em 1862 foi criado o Pepper’s Ghost em Londres pelo professor Pepper e seus alunos. Eles conseguiram produzir um fantasma “dimensional” que podia contracenar com atores através de uma tela de vidro grande e inclinada e um jogo de luzes, os quais refletiam o ator coberto por um tecido e assim ele interpretava o fantasma.
Foi necessário trazer a breve biografia de Robertson para identificar pontos de contato com o protagonista do filme O Ilusionista, obra que discutiremos no tópico a seguir.
As imagens fantasmagóricas no filme O Ilusionista e na instalação A Body of Water
O filme O ilusionista (2006), roteirizado e dirigido por Neil Burger foi baseado no conto The Ilusionist de Steven Milhauser, conforme a abertura do filme nos informa. A cena inicial mostra a apresentação do espetáculo de fantasmagoria, com Eisenheim (Edgard Norton) sentado no palco iluminado do teatro, uma espectadora da plateia grita, ao ver uma presença se materializando e a reconhecendo como a duquesa assassinada. Diante desse fato, Eisenheim recebe a voz de prisão do inspetor chefe Uhl (Paul Giamatti) pelo crime de charlatanismo. O desenrolar da narrativa, evidencia a juventude de Eisenheim quando ele era um jovem chamado Edward, filho de um marceneiro, que tem um encontro “místico” com um mágico que lhe ensina alguns truques. Ao praticar a mágica pelas ruas da cidade, desperta o interesse da jovem duquesa Sophie (Jessica Biel), porém devido a desigualdade social entre as famílias, o amor se torna algo impossível. Ele deixa a cidade de Viena, em busca de melhorar a sua mágica, durante quinze anos percorre a Rússia, Ásia menor e Oriente, só retorna a Viena como o ilusionista. Nas primeiras apresentações no teatro da cidade, Eisenheim apresenta números de mágica, como o da figura 4, em que diante da plateia, ele faz uma semente de laranja se desenvolver rapidamente em uma laranjeira e gerar frutos.
Fonte: O Ilusionista (2006) de Neil Burger
Em uma apresentação com a presença do príncipe Leopold (Rufus Sewell) na plateia, Eisenheim faz sua primeira ilusão ao mostrar uma espécie de alma saindo de um corpo duplicado. Nesse “truque” Eisenheim pediu uma voluntária do público, então o príncipe Leopold ofereceu a sua noiva Sophie, o amor de infância de Eisenheim, ver as figuras 5 e 6.
Fonte: O Ilusionista (2006) de Neil Burger
Foi nessa apresentação que Eisenheim e a duquesa Sophie se reconheceram, e ao constatar que o amor permanecia igual, e que o príncipe Leopold não a deixaria partir, o ilusionista orquestra um plano onde a ilusão está presente dentro e fora do teatro. Eisenheim compra um teatro abandonado, despede seu agente e contrata orientais para ajuda-lo nesse novo projeto, onde ele possibilitará a visualização das almas, conforme as figuras 7 e 8.
Fonte: O Ilusionista (2006) de Neil Burger
Os fantasmas que Eisenheim consegue trazer do mundo espiritual conservam a habilidade da fala e conversam com a plateia, o que atrai para os espetáculos seguidores cada vez mais apaixonados e leais. De forma contrária, desperta a fúria do príncipe Leopold e a preocupação do inspetor chefe. O ilusionista é levado várias vezes a delegacia e confessa que não consegue trazer as almas para o seu espetáculo, que tudo é ilusão, e mostra o aparelho que permite tal mágica, ver figura 9.
Fonte: O Ilusionista (2006) de Neil Burger
Há uma cena no filme, que é evidenciado o uso de lanternas mágicas, cena em que os funcionários de Eisenheim empacota os objetos do espetáculo, após ele ser obrigado a encerrar a sua estadia no teatro, e ele os adverte para não levar as “lanternas”. Sendo assim, o aparato de projeção, as lanternas mágicas são evidenciadas na narrativa. Não iremos nos aprofundar na trama do filme, já que a nossa intenção é apenas contextualizar o protagonista nos espetáculos de fantasmagoria, para podermos identificar elementos que se aproximam da arte de imersão, A Body of Water. Aqui, é relevante evidenciar que a mídia da fantasmagoria está inserida na história da imersão, um fenômeno reconhecido há alguns anos, mas que já estava presente em quase toda a História da Arte ocidental. A imersão ocorre quando há a convergência entre as obras de arte e o aparato de imagem, ou ainda, quando a mensagem e o meio se tornam uma unidade, difícil de separar e de visualizar.
Na fantasmagoria juntam-se fenômenos que estamos vivenciando novamente na representação visual e artística. É um modelo para a “manipulação dos sentidos”, o funcionamento do ilusionismo, a convergência do realismo e da fantasia, a verdadeira base material de uma arte que parece imaterial, bem como as questões associadas pertencentes à epistemologia e à obra de arte em si (Grau, 2009, p.251).
As imagens projetadas pela lanterna mágica exploraram percepções existentes nas massas, e as aumentaram através das novas mídias com um imenso poder sugestivo. Os espaços fantasmagóricos exercem uma relevante função para interligar as mídias utópicas em outras áreas da artemídia, como a arte telemática, caso da instalação A Body of Water.
Grau (2009) nos informa que essa instalação, conforme a figura 10, mostra a forma fantasmagórica do poder social da arte. Em uma sala em chroma-key, os visitantes do Museu Wilhelm Lehmbruck conseguem entrar em contato com os visitantes de uma mina desativada, em uma segunda locação da instalação – o vestiário de Herten.
Projetadas sobre pirâmides transparentes formadas por borrifos de água vindos de chuveiros na mina, as imagens dos visitantes do museu ganhavam um intimismo fantasmagórico (Grau, 2009, p.253).
O autor reforça que nesse cenário de ruína da era industrial, os artistas Paul Sermon e Andrea Zapp conseguiram criar uma experiência sinistra, porém com vivacidade. Ao desenvolver um espaço fantástico que traz a memória mineiros, os quais tinham como hábito lavar o pó de carvão dos seus corpos suados, Semon amplia a arte telemática, além de incluir a crítica social. É interessante aqui, trazer um panorama introdutório do entrelaçamento da arte e da tecnologia.
Zanini (1998) enfatiza que a arte das novas tecnologias se estruturou em distintas categorias, as primeiras criações artísticas com o uso da tecnologia surgiram em países mais desenvolvidos, de onde foram disseminados para os demais. Na década de 1980, o uso do microcomputador em diversos ambientes, proporcionou aos artistas o acesso a uma nova ordem de sensibilidades espaciais, marcada pelo domínio das distâncias.
As potencialidades do sistema integrado das tecnologias em evolução, com seus consideráveis e crescentes recursos interfaciais, após longo período de desenvolvimento isolado de diferentes mídias – desde o rádio e a televisão – despertou, de início, o interesse de uma fração significativa de artistas, principalmente de origem anglo-saxã, interessados na utilização das redes de longa distância (um conjunto de computadores que utiliza links de telecomunicações) (Zanini,p.12,1998).
O autor cita a arte telemática, como tendo o seu nome surgido na França em 1977 por Simon Nora e Alain Minc, a qual significa - a conectividade entre a tecnologia da informática e a da telecomunicação, nessa categoria de arte verificou-se um grande impulso da imaterialidade das linguagens poéticas da época. Essa nova arte então, utiliza as disponibilidades interfaciais das máquinas, e a criação se efetua em espaço multidimensional, o ciberespaço. Arte de vocação dialógica, desprovida de valor de mercado, conseguiu formar diversas parcerias, para além das divisas nacionais e ideologicas. Um ponto que se destaca é o rompimento do clássico estado personalizado da criação. A interação social efetuada no espaço e tempo telemático gerou uma configuração inovadora ao cruzar ideias e emoções, e proporcionar alianças de trabalho que repercutiu na transformação do estatuto da arte. A interligação dos dispositivos tecnológicos digitais permite a eliminação das distâncias geográficas e possibilita a instantaneidade de contatos plurais.
Na utilização do espaço telemático vemo-nos diante de um trabalho alicerçado na co-responsabilidade de colaborações articuladas por um projeto. É uma instauração de mundos virtuais constituindo uma psico-realidade no continuum do fluxo eletrônico, em estado de provisoriedade suscetível a renovadas incrustações (Zanini, p.14,1998).
Sendo assim não existe mais a dependência de um único agente, e sim uma participação organizada de vários artistas e especialistas da área tecnológica através dos dispositivos da internet. Na arte telemática, tanto o conceito de autoria como o de público se transforma. Trata-se de outra formação criadora, totalmente diferente da obra de arte tradicional. É interessante destacar que a arte telemática surgiu no final dos anos 1970, teve um desenvolvimento acentuado nos anos de 1980 com o surgimento de alguns dispositivos tecnológicos, porém na década de 1990 o acesso à internet possibilitou a manifestação dessa expressão de arte.
A percepção de um mundo que emergiu da informação digitalizada na rede de computadores, estabelecendo a instantaneidade/ubiquidade das comunicações, vem dominando rapidamente todos os níveis da vida pragmática mas também atingindo esferas profundas do pensamento e da cultura. Uma dimensão estética inédita despontou no ciberespaço (Zanini, p.34,1998).
A interconexão entre arte, ciência e tecnologia se tornou cada vez mais prolifera no decorrer das últimas décadas, e em pleno século XXI percebemos o avanço considerável dessa arte imersiva e digital, com a utilização dos recursos de realidade virtual, aumentada e mista, gamificação, inteligência artificial e metaverso. O nosso estudo não aprofundará tais conceitos, já que a instalação A Body of Water se trata de uma arte telemática do ano de 1999.
Fonte: Grau (2009).Arte, ciência e Tecnologia,Unesp.
No site de um dos criadores da instalação A Body of Water, paulsermon.org, temos a descrição da forma como foi organizada esta instalação, a qual ocupou três locais: a sala chroma-key do museu Wilhelm Lehmbruck em Duisburg, o vestiário do Waschkaue Herten e o banheiro do Waschkaue Herten. O público do museu em Duisburg e dos dois espaços em Herten estão conectados da seguinte forma: Uma câmera de vídeo no museu captura as imagens do público em frente a um cenário de chroma key, e envia para Herten através de um sistema de videoconferência ISDN. A imagem é recebida em Herten juntamente com a imagem de câmera do público no vestuário de Herten. A imagem mista em chroma key é projetada em vídeo em uma parede fina de água, a qual é pulverizada por chuveiros de pressão forte no banheiro de Herten. Uma câmera ao lado do projetor consegue capturar a imagem projetada e transmite para três monitores no vestiário de Herten, e retorna de volta através do sistema de conferência ISDN, para três monitores no museu. O banheiro em Herten é a parte central da instalação, todas as camadas visuais e conceituais estão concentradas nesse espaço. A instalação suscita uma reflexão acerca das mudanças da cultura industrial da região. De um lado, os espectadores estão de frente com a tecnologia, a plataforma interativa de comunicação em rede, videoconferencia, e do outro lado, os espectadores vislumbram as sombras fantasmagóricas dos antigos mineiros se banhando na água, como um flashback no espaço abandonado da antiga cultura do trabalho. É relevante informar que a mina de carvão de Schlegel und Eisen na Alemanha e os chuveiros e balneários do Waschkaue Herten estão fechados desde o ano de 1997. Na época do seu funcionamento, mais de 1000 mineiros utilizavam o Waschkaue todos os dias.
No tópico a seguir, o filme O ilusionista e a obra telemática A Body Of Water se encontram através das caraterísticas dos espetáculos de fantasmagorias.
Interrelacionando os espetáculos de fantasmagorias: Os fantasmas do Ilusionista e os fantasmas dos mineiros.
Para refletir os pontos de contatos que há entre o filme O ilusionista (2006) e a instalação telemática A Body of Water (1999) a partir dos espetáculos de fantasmagoria, faz-se necessário compreender a contextualização sócio-histórica e cultural das obras pesquisadas destacando principalmente a trama e a estética. Ao compararmos a história do espetáculo de fantasmagoria com o filme O ilusionista, percebemos que existem personagens e acontecimentos da obra fílmica que parecem ter sido inspirados nas intrigas vivenciadas por Robertson e seus contemporâneos. Como também há pontos de distanciamento, caso do contato inicial dos futuros ilusionistas com as técnicas. Na história da fantasmagoria, diferentemente do personagem Eisenhein que saí da cidade europeia de Viena e parte para Rússia, Ásia menor e Oriente com o objetivo de desenvolver sua mágica, Robertson conhece o espetáculo de Philidor, e o aprimora.
Em suas Mémoires, Robert afirma que suas primeiras experiências com a lanterna mágica datam de 1784, em Liège, quando, diante do amigo Villette, fez “claudicar as sombras”. Mais adiante, ele menciona o nome do cientista Béer, citado por Waldeck. De fato, Robert pretendeu apresentar suas primeiras sessões de fantasmagoria no laboratório de física de Béer, situado à Rue de Clichy, mas acabou optando por um local menos impregnado de “ignorância e mesquinharia”, o Pavillion de l’Échiquier (Mannoni,p.163, 2003).
Podemos pensar que na obra O ilusionista, os roteiristas Burger e Millhauser, podem ter se inspirados no Teatro das sombras da Ásia e nas tradições dos bonecos de sombras do Oriente Médio para indicar a origem das técnicas assimiladas por Eisenheim. Koutsantonis (2021) nos informa das artes e dos rituais das primeiras narrativas do Teatro das sombras de países, como China, Taiwan, Índia, Indonesia, Camboja, Malásia e Tailândia, bem como as tradições do Oriente Médio, principalmente na Turquia, com o Karagoz, e na Grécia com o Karagiozi. Tradições culturais que influenciaram outros países europeus a desenvolver vários gêneros de espetáculos itinerantes com o uso de marionetes e sombras, tais como a lanterna mágica e as silhouettes, técnica de animação de silhuetas no cinema criada pela alemã Lotte Reiniger (1899-1981). Na obra fílmica estudada, quando o personagem Eisenhein abandona os truques de mágica, ele contrata asiáticos para o auxiliarem na condução dos espetáculos de fantasmagoria, mais uma alusão ao Teatro de sombras do continente asiático.
Um ponto em comum entre a biografia de Robertson com o filme O ilusionista é percebido nas acusações de crimes contra os ilusionistas. O personagem Eisenheim foi detido algumas vezes sob acusação de charlatanismo, por trazer almas de pessoas mortas para o palco. Inclusive a alma de uma aristocrata assassinada provocando tumulto na plateia, caso da aparição do espectro da personagem da duquesa Sophie. Já nas apresentações de Robertson, Mannoni (2003) nos diz que o jornalista François Martin Poultier – Delmonte relata ao jornal L’Ami de Lois que Robertson promete trazer almas de pessoas importantes.
Poultier-Delmotte termina dizendo que um velho chouan havia pedido para ele evocar Luís XVI, ao que Robertson respondeu: “Eu tinha um método para isso, antes de 18 de frutidor [o golpe de Estado do Diretório, em 4 de setembro de 1797], mas o perdi desde então”. Poucos dias após a publicação desse artigo, Robertson sofreu uma invasão da polícia. Em março de 1798, o Diretório estava no poder, e a guerra prosseguia: os franceses acabavam de tomar Berna, e a República havia sido proclamada em Roma; portanto, não era a ocasião ideal para ressuscitar a realeza (Mannoni, p.166, 2003).
Robertson nega as acusações do jornalista Delmonte no seu livro de memórias. Mas após a veiculação do artigo, a ele lhe foi atribuido alguns improváveis golpes de velhacaria, como o de receber pedidos para apresentar almas de pessoas conhecidas a espectadores saudosos. No filme, O ilusionista, o príncipe delega ao inspetor Uhl a missão de expor a verdade por trás do trabalho do mágico. Ja na biografia de Robertson, Mannoni (2003) cita a perseguição dos jornalistas dos jornais L’Ami des Lois e Le Journal de Paris ao ilusionista, inclusive com alusões ao uso da lanterna mágica.
Os redatores destes dois jornais provavelmente descobriram o segredo que Robertson tanto procurava esconder: era a velha lanterna mágica que criava belas aparições. Mas a intenção dos jornalistas era sibiliana. Não pretendiam se livrar de Robertson, um bom cliente, que prublicava anúncios toda semana (Mannoni, p.166,2003).
Já em relação à instalação telemática A Body of Water, podemos relacionar tanto aos espetáculos de fantasmagoria de Robertson, quanto das apresentações de espectros do personagem Eisenheim pela efemeridade das apresentações. As sombras fantasmagóricas dos mineiros lavando seus corpos, retirando os pós provenientes das minas de carvão, nos mesmos espaços usados anteriormente provoca nos espectadores uma reflexão sob as práticas dos operários das minas, nos momentos de relaxamento, já que o trabalho insalubre e de alta periculosidade os faz conviver com a morte diariamente. Os banheiros e os vestiários da antiga mina alemã recebiam milhares de mineiros por dia, o que pode nos induzir a pensar no valor que é dado a vida de pessoas que se arriscam para que outras possam ter acesso a energia. Enquanto os espetáculos de fantasmagorias reais e fictícios ( filme) nos possibilita a visualização de fantasmas, a obra artística telemática permite a visualização de sombras de mineiros de carvão em práticas de higiene que poderiam ser as últimas de suas vidas. A brevidade da vida é o tema a ser discutido, seja atráves dos espectros ou das imagens dos profissionais que trabalham lado a lado com a morte.
A estética é um dos pontos que consegue interligar todas as obras, mesmo que sejam de épocas distintas. A aparição dos “fantasmas” seja no teatro de Roberston, no cenário do teatro de Eisenheim ou no espaço destinado a higiene da mina alemã, o contraste da escuridão do ambiente com a claridade dos espectros é marcante. Essa exaltação da escuridão nesses espaços fantasmagóricos tem uma função na narrativa. Recorremos a Camarani (2014) que nos explica que o fantástico deve aparecer junto à representação do real, e a sua definição implica no desequilíbrio ou na pertubação das leis reconhecidas, ou seja, no mundo real em que vivemos estamos diante de determinados fenômenos de ordem extrasensorial, que nos conduz a atitudes de hesitação. Essa é a premissa da literatura fantástica, que teve seu ápice no século XIX.
Considera, assim, que as ficções fantásticas respondem aos anseios de um público posterior à Revolução Francesa, fatigado por séculos de racionalismo e ávido por toda a espécie de sensações e sentimentos (Camarani, 2014, p.15).
Camarani cita Furtado para nos informar que todos os elementos da narrativa devem estar dispostos em função da ocorrência do sobrenatural, tanto para contribuir ou não para sua aceitação, provocando a ambiguidade, característica própria do fantástico. Sendo assim, a oposição do real /irreal é reproduzida e desenvolvida no próprio espaço representado na narrativa, ajustando dois elementos supostamente opostos, porém complementares.
Um que apresente componentes “realistas”, representando o real e simulando as leis naturais; outro, composto por elementos “alucinantes” que, segundo Furtado, surgem em menor número e contribuem para introduzir dados anormais no cenário anterior, desconformes com os traços do universo do destinatário da enunciação; o crítico aponta que muitos elementos que chama de “alucinantes” são oriundos dos romances góticos (Camarani, 2014, p.116).
É a partir dessa perspectiva que a maior parte das narrativas fantásticas privilegia espaços delimitados e fechados, bem como o interior de ambientes .Então, os cenários desse gênero literário, são geralmente representados em casas amplas, contruções labirínticas, como antigos castelos góticos em áreas distantes. É perceptível também a ausência da luz e da cor favorecendo a escuridão ou as tonalidades sombrias. Relacionando as características dos cenários das ficções fantásticas com os espetáculos de fantasmagorias, temos que esses eventos aconteciam em teatros com pouca luminosidade até para que “os fantasmas” pudessem se destacar e gerar uma certa pertubação emocional nos espectadores. E a obra telemática, desenvolvida em três espaços, dois desses cenários – banheiro e vestiário de uma mina desativada, também oportunizou a construção industrial decadente como coadjuvante para que as sombras dos mineiros fossem os protagonistas.
Ao observar a contextualização cultural da época dos primeiros espetáculos de Robertson, no século XVIII na capital francesa verificamos que se encontrava na última fase da Revolução Francesa, o diretório (1794-1799). Battistoni Filho (2008) afirma que a atmosfera sociocultural reinante reagiu fortemente contra o estilo rococó do Antigo Regime, e os artistas revolucionários ao invés de criarem uma nova tradição, preferiram retornar ao que percebiam como um classicismo puro, supondo estar em equilíbrio com os ideais racionalistas da nova ordem. Foi convencionado chamar essa estética vigente de Neoclássico.
Este estilo procurou expressar e interpretar os interesses, a mentalidade e os hábitos da burguesia manufatureira e mercantil da época da Revolução Francesa e do Império Napoleônico. É chamada arte acadêmica, porque os seus princípios estéticos passam a ser adotados nas acadêmias oficiais existentes na Europa (Battistoni Filho, p.87,2008).
Já no filme O Ilusionista, a narrativa se desenvolve no início do século XX, na cidade de Viena, capital da Áustria. Schons (2019) nos informa que o período entre o final do século XIX e o início do século XX foi marcado por transformações relevantes, como o surgimento do movimento intelectual Modernismo, e a inovadora teoria da mente humana e das técnicas terapeuticas por Freud; bem como uma nova geração de filósofos liderados por Husserl romper com o positivismo. Além da criação da mecânica estatística pelo físico Boltzmann. Em relação à estética da época, Schons (2019) acrescenta que na arquitetura, Otto Wagner e seu discípulo Adolf Loos abandonam o estilo do barroco austríaco, e seguem uma postura mais funcional, privilegiando superfícies lisas. No filme O Ilusionista, presenciamos o estilo mais detalhado – barroco nos cenários da residência do personagem princípe Leopold, porém o Teatro onde os espetáculos de fantasmagorias acontecem apresentam formas mais funcionais sem nenhum excesso de adornos.
E por último temos o cenário do interior do prédio em estilo industrial onde a instalação A Body of Water projetou as sombras fantasmagoricas dos mineiros, no final da década de 1990, ver figura 11.
Fonte: paulsermon.org/herten/herten.html
Por se tratar de uma instalação artística, optamos por privilegiar alguns conceitos de arte no pós-moderno para contextualizar a estética envolvida. Battistoni Filho (2008) explica que o termo pós-moderno foi criado pelo historiador inglês Arnold Toynbee em 1947 para designar todas as transformações ocorridas nas ciências, nas artes e nas sociedades avançadas; imersos na era da informática, todos recebem um tratamento computadorizado. Há o domínio da tecnocência, a qual programa o comportamento das pessoas no cotidiano. Percebemos as características da Minimal Art no cenário de Herten.
A Minimal Art surgida no final dos anos sessenta, fez com que os traços estéticos, como forma, cor, composição e emoção, fossem descartados do objeto artístico, reduzindo-o a uma simples estrutura primária. Para a Minimal Art só interessam os materiais sintéticos enriquecedores da tecnologia (Battistoni Filho, p.146,2008).
É o que podemos identificar na figura 11, o cenário do banheiro de Herten, uma estrutura simples com os multiplos chuveiros industriais e os aparatos tecnológicos da época reforçam a estética do mínimo em favor da tecnologia. Faz-se necessário lembrar que essa arte telemática utilizou três cenários, dois espaços em Herten, prédio da mina de carvão desativada, e o museu em Duisburg. Battistoni Filho (2008) explica que no museu pós-moderno, o espectador deixa a atitude passiva e se torna participante ativo da obra. O foco é dirigido às manifestações ambientais, plurissensoriais, cináticas e conceituais. Na obra A Body of Water, os visitantes do museu conseguiram interagir com as sombras fantasmagóricas dos mineiros projetadas no jato forte de águas dos chuveiros industriais suscitando vários questionamentos e reflexões.
Conclusão
Este artigo se propôs a refletir a importância da mídia das lanternas mágicas como impulsionadora da representação das imagens em movimento em uma sala escura com um público. Os criadores das lanternas mágicas utilizaram conhecimentos científicos, sobretudo da área da física para projetar tais imagens, porém o objetivo inicial dessas projeções foi provocar nos espectadores o temor a Deus, caso dos lanternistas jesuítas. A partir da criação do fantascópio, lanterna mágica que é usada para projetar a fantasmagoria, os espetáculos se tornaram populares. O cientista Robertson aprimorou o equipamento e os espetáculos criados pelo também físico Paul Philidor. Nesses espetáculos, tudo converge para o sobrenatural, a escuridão, os objetos macabros do cenário, a sonorização e enfim os protagonistas – os fantasmas ilustres ou por encomenda entretem o público, que a cada dia se tornou mais apaixonado por esses espetáculos sinistros. Um prenúncio dos filmes de terror, hologramas, experiências imersivas. Utilizamos o conceito dos espetáculos de fantasmagoria para interrelacionar com o filme O ilusionista (2006) e a instalação telemática A Body of Water (1999), buscando identificar os pontos de aproximação e de afastamento. Identificamos algumas similitudes principalmente na narrativa do ilusionista Robertson e do protagonista do filme, Eisenheim. Ambos foram vistos como charlatães e foram chamados para interrogatórios na polícia, mas isso não foi o suficiente para afastar o público que se maravilhava com as imagens fantasmagóricas. Despertando o fascínio pelo imaginário da cultura popular dos fantasmas, e dos contos fantásticos. Percebemos que a estética das obras estudadas também se assemelham, a escuridão total das apresentações só é quebrada pelas imagens dos espectros, bem como os espaços fantasmagóricos privilegiam os cenários fechados e antigos. A instalação A Body of Water suscita no público do museu o vislumbre das imagens fantasmagóricas dos antigos mineiros se banhando no cenário do vestiário de Herten, essa experiência da arte imersiva além de resgatar a cultura dos mineiros provoca questionamentos sobre a fugacidade da vida, e das práticas tecnológicas que diminuem as distâncias na fruição da arte. Enfim, o filme O ilusionista, os próprios espetáculos de fantasmagoria e a obra A Body of Water nos faz pensar como a representação dos fantasmas, gera fascínio desde épocas passadas, e que o avanço tecnológico nos permite apreciar dintintas formas de imersão com essas imagens em movimento.
Bibliografia
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Filmografia
O ilusionista. 2006. De Neil Burger. Estados Unidos/Tchéquia: Imagem Films. DVD