Abstract
Belonging to the Circuito Liberdade, which brings together cultural spaces in Belo Horizonte - Brazil, the Espaço do Conhecimento UFMG is a museum that aims to promote scientific and cultural dissemination. Since 2010 it houses a long-term exhibition, temporary exhibitions, an astronomical terrace and a planetarium, with optical-mechanical and digital projectors. Throughout its ten years of existence, the Espaço do Conhecimento UFMG has been producing immersive content for the planetarium that go beyond themes focused on astronomy. Within this context, and motivated by the repeated socio-environmental crimes committed by mining companies in Minas Gerais, the documentary “Inconfidências” was produced, which aimed to offer a critical discussion about mining activity in the State. Based on a historical analysis, experts and environmentalists evaluate the impacts of mining, the recurrent criminal disasters, and propose a reflection on the future of activity. With a premiere date scheduled for May 2020 at the Espaço do Conhecimento UFMG planetarium, Inconfidências remains unprecedented in hemispheric projections, since the planetarium was closed to the public in March 2020 due to sanitary issues related to the COVID-19 pandemic, without reopening prevision. So, the documentary was adapted for projection on flat screens and officially launched on 12/11/2020 as part of the commemorative events for the ten years anniversary of Espaço do Conhecimento UFMG, and made available on its Youtube channel. This article deals with the transposition of the original fulldome format of the documentary to its flat version, allowing a reflection on the challenges and solutions found in this process.
Keywords: Planetarium content, Fulldome, Flat media, Espaço do Conhecimento UFMG, Inconfidências
Introdução
Como um dos equipamentos culturais que compõem o Circuito Liberdade2 em Belo Horizonte, o Espaço do Conhecimento UFMG foi inaugurado em 2010 com uma proposta diferenciada de divulgação do conhecimento ligado às ciências, às artes e à tecnologia, e desde então vem contribuindo fortemente com a produção e divulgação da cultura no Estado de Minas Gerais. Pode-se dizer que trata-se de um museu dedicado à divulgação do conhecimento em suas diversas vertentes: do acadêmico ao tradicional, do artístico ao científico.
Localizado na tradicional praça da Liberdade, seu edifício de cinco andares abriga a exposição de longa duração Demasiado Humano, além de ter um andar dedicado às exposições temporárias desenvolvidas em articulação com a comunidade acadêmica e outros parceiros. Conta também com um terraço astronômico, de onde realizam-se observações noturnas, além de abrigar um planetário pioneiro em Minas Gerais. Assim,
A sua função primordial é estimular a reflexão, apresentando o que há de mais avançado nas pesquisas universitárias em uma linguagem esteticamente atraente e, ao mesmo tempo, acessível e rigorosa. Temas ligados às ciências, às artes e às tecnologias serão objeto de suas mostras temporárias e de experimentos interativos nos três andares de salas de exposições que compõem o edifício (LEITE, 2010)
Dentre os equipamentos disponíveis para as ações de extensão, destacam-se duas mídias audiovisuais relativamente pouco difundidas no Brasil: a Fachada Digital3, tela especial voltada para o espaço externo ao museu, com projeções noturnas na superfície vítrea da fachada do edifício; e um planetário híbrido, que alia recursos de projeção digital à tradicional projeção óptico-mecânica de simulações da abóbada celeste.
Diferentemente da maior parte das instituições nacionais que abrigam planetários, o Espaço do Conhecimento UFMG conta com um Núcleo de Audiovisual, que é uma equipe focada na pesquisa e desenvolvimento de produções para essas telas, considerando-se suas especificidades técnicas e de linguagem. Assim, no caso do planetário, tem sido possível ao Espaço do Conhecimento UFMG produzir conteúdos próprios que passam a integrar sua programação diária, em alternância com produções audiovisuais fulldome compradas no mercado internacional, e com as sessões comentadas de astronomia, desenvolvidas pela própria equipe da instituição. Portanto, o Espaço do Conhecimento UFMG busca dar uma utilização mais ampla ao seu planetário, não o restringindo apenas à sua natural vocação de meio privilegiado para os temas ligados à astronomia.
É essa sensação de aventura e descoberta combinada com os mistérios e a infinitude do espaço que tem sido o esteio de quase todas as apresentações e experiências educacionais dentro de um planetário. Com novas ferramentas chegando na vanguarda do kit de ferramentas de apresentação em cúpula, é importante que todas as pessoas associadas a planetários e teatros em cúpula se esforcem para manter e melhorar esta experiência. (Matthews, 2005 - tradução nossa)4
Dessa forma, pesquisas, projetos de extensão e minicursos de produção fulldome vêm acontecendo ao longo do tempo, o que foi importante para o amadurecimento do seu Núcleo de Audiovisual. Atualmente, esse núcleo participa ativamente das exposições temporárias com a proposição e produção de conteúdos para o planetário a elas associados. Assim, no contexto da exposição temporária Canção Amiga, ocorrida em 2017, produzimos o filme Entre Discos e Esquinas, nosso primeiro conteúdo para projeção fulldome integrado à curadoria de uma exposição. Naquele mesmo ano, produzimos o filme Perspectivas Austrais, no contexto da exposição Expedição Antártica. Esses dois filmes permaneceram na grade de programação do planetário do Espaço do Conhecimento UFMG mesmo depois do encerramento das respectivas exposições.
Mas foi com o filme O Céu como Patrimônio (2016) que pudemos de fato experimentar, no Espaço do Conhecimento UFMG, as possibilidades do gênero documentário adaptado a um ambiente imersivo. Trata-se de um filme independente proposto conjuntamente pelos núcleos de Astronomia e de Audiovisual, sem qualquer associação às exposições do Espaço. Assim, a ideia inicial de produzir um documentário tendo o céu como tema, deu origem a um projeto apresentado ao Edital Filme em Minas, da Secretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais - SECULT-MG, em que fomos selecionados em 2014 na categoria Formatos Especiais por tratar-se de um projeto voltado para exibição em uma tela não convencional de cinema.
Vale ainda ressaltar que, além de compor a programação do Espaço do Conhecimento UFMG, O Céu como Patrimônio está disponível para download no site da Associação Brasileira de Planetários – ABP5, possibilitando o acesso de todos os planetários brasileiros associados, que podem exibi-lo livremente. Além disso, o filme foi exibido no Festival Immersphere, realizado no Planetário de Brasília em 20176, e na abertura do XXII Encontro Anual da Associação Brasileira de Planetários, ocorrido em Belo Horizonte, 2017.
Este trabalho traz um relato da experiência da equipe do Núcleo de Audiovisual do Espaço do Conhecimento UFMG com a produção de um filme documentário para exibição em seu planetário a partir do tema relacionado aos impactos da mineração no Estado de Minas Gerais - Brasil, bem como da necessidade de transposição desse conteúdo para um formato adequado à exibição em mídias planas como consequência das medidas sanitárias decorrentes da pandemia de COVID-19, o que trouxe como resultado a possibilidade de expansão da audiência para além do público restrito das projeções hemisféricas.
Inconfidências7
Após o acidente criminoso do rompimento de uma barragem de rejeitos da empresa mineradora Vale, ocorrido em 25/01/2019 no município mineiro de Brumadinho, e considerando a recorrência de acidentes da mesma natureza no Estado de Minas Gerais, Brasil, iniciamos no Espaço do Conhecimento UFMG uma discussão sobre a necessidade de fazermos um filme documentário sobre o acidente para projeção na tela hemisférica do nosso planetário. A ideia era proporcionar ao espectador uma imersão nas imagens produzidas no cenário daquela tragédia, o que poderia contribuir para a reflexão e o debate sobre esses eventos.
No entanto, a ideia evoluiu para uma abordagem mais ampla sobre a atividade minerária no Estado, uma vez que os acidentes se sucedem e representam apenas uma das consequências trágicas dessa atividade exploratória de um bem comum, que apresenta evidentes características predatórias do ponto de vista econômico, social e ambiental. A partir daí, questões como a perda de cursos d’água, e até mesmo de grandes rios, ganham relevância e merecem maior discussão. Também nesse contexto, as perspectivas de desabastecimento de água não apenas para pequenas comunidades no entorno das cavas de mineração, mas também para grandes populações como a própria região metropolitana de Belo Horizonte, carecem de uma reflexão no âmbito da universidade pública, que deve manter-se em constante diálogo com a sociedade como um todo.
Em consonância com este cenário trágico, verifica-se a atual tendência à flexibilização das leis, das licenças ambientais e das fiscalizações implementadas pelos nossos governantes, que colocam em risco importantes biomas no Estado, assim como ambientes de grande importância histórica, cultural e religiosa para nossa população, como a Serra da Piedade em Caeté - MG.
Assim, o documentário propõe uma reflexão sobre a atividade mineradora no estado de Minas Gerais, sendo que seus impactos ao longo dos anos foram analisados por profissionais das mais variadas áreas de atuação, que de alguma forma se relacionam com a mineração. Os depoimentos desses profissionais foram gravados em entrevistas individuais, quando buscou-se abordar os aspectos históricos da mineração em Minas Gerais, suas implicações políticas, econômicas, ambientais e sociais na atualidade, bem como as perspectivas futuras para a atividade minerária no Estado. Constituiu-se assim uma narrativa documental composta por múltiplas vozes, capaz de apresentar e discutir o tema de forma crítica.
A produção do documentário propôs uma estrutura narrativa desenvolvida a partir da articulação entre os vários depoimentos coletados, que se complementam e se integram com as imagens captadas, possibilitando a criação de uma obra marcada por uma visualidade imersiva de grande impacto e pelo debate crítico acerca do tema. Ao invés de uma voz narrativa única, impessoal, científica e supostamente neutra, experimentou-se uma narração composta pela multiplicidade de vozes de sujeitos com origens e experiências diversas, que tiveram grande liberdade para expressar suas visões particulares sobre o tema. Além disso, o filme conta com algumas sequências compostas apenas por imagens e sons, sem qualquer narração, que contribuem de forma bastante expressiva com a narrativa fílmica.
Nesse sentido, tanto do ponto de vista temático quanto da estrutura narrativa o filme revela potencial inovador em relação à maior parte das produções Fulldome. Nota-se, neste campo, uma carência de produções alternativas aos documentários didáticos sobre astronomia e que muitas vezes não refletem com propriedade a vocação e a filosofia do Espaço do Conhecimento UFMG. Na maior parte das produções Fulldome comerciais, nota-se o predomínio de uma forte voz pedagógica que, se por um lado, parece eficaz na apresentação de informações astronômicas, mas por outro parece fortalecer a ideia de um conhecimento científico pronto, cumulativo e inquestionável. Além disso, nota-se a recorrência de certos padrões estéticos e narrativos que se valem dos recursos imersivos como atrativos para o público, mas que pouco parecem problematizar, de forma crítica, temas cujo debate coletivo se mostra fundamental. Assim, a imersão não chega a conduzir, efetivamente, a uma nova perspectiva sobre o mundo, capaz de deslocar temporariamente o espectador a um novo jeito de perceber uma determinada realidade em suas dimensões políticas, sociais, ambientais, o que constituía a proposta inicial do documentário Inconfidências.
Com tudo isso, acreditamos que as sequências de imagens e os depoimentos captados confluíram para a criação de um documentário forte e potente, capaz de envolver o espectador no tema, contando ainda com a valiosa contribuição do ambiente imersivo proporcionado pelo planetário.
Ressalta-se finalmente que a produção do documentário imersivo foi viabilizada por recursos do Edital Arte e Cultura, do Sindicato dos Professores de Universidades Federais de Belo Horizonte e Montes Claros – APUBH.
Questões técnicas sobre Fulldome
O termo fulldome refere-se ao padrão de vídeo digital específico para projeção em telas hemisféricas. O formato final da imagem produzida para este padrão, denominado Domemaster, conforme padronização de instituições como a associação IMERSA (Immersive Media Entertainment, Research & Arts)8, vem sendo utilizado nos planetários digitais ao redor do mundo, o que possibilita ampla circulação de conteúdos considerando-se um circuito de planetários, fixos ou móveis, no Brasil e no exterior.
Desenvolvido desde o final dos anos de 1990, essa padronização derivou da emergência dos recursos audiovisuais para planetários nas décadas anteriores, fazendo com que o planetário passasse a incorporar outras possibilidades de exibição de conteúdo, além da simulação do céu noturno possibilitada pela projeção por meio de projetores tradicionais óptico-mecânicos.
Em tempos mais recentes, os planetários foram atualizados para fornecer projeção digital de cúpula completa, ou seja, um filme é projetado perfeitamente na superfície da cúpula a um padrão de 30 quadros por segundo. Para planetários maiores, esta projeção em cúpula completa é obtida com vários projetores […] que são cuidadosamente alinhados e as bordas mescladas nas regiões de projeção sobrepostas. [...] O conteúdo não se limita à astronomia e nem mesmo à educação científica, mas a qualquer assunto. (Bourke, 2005 – Tradução nossa)9
A imagem digital característica deste formato possui alta resolução e se apresenta em forma de um círculo inscrito em um quadrado (razão 1x1). Como indica a terminologia em inglês, tal imagem, quando projetada, ocupa toda a cúpula e preenche o campo de visão do espectador.
Figura 1 - Imagem na razão 1x1, produzida para projeção em tela hemisférica. Fonte: documentário Inconfidências.
Os protocolos fulldome podem ser cumpridos com diferentes configurações técnicas. Basicamente, é necessário uma tela hemisférica rígida ou inflável (no caso de planetários móveis), sobre a qual a projeção preenche a superfície da cúpula de forma mapeada, compondo uma única imagem hemisférica (180 x 360°). Embora muitas vezes a projeção seja efetuada por um conjunto de projetores, as diversas fontes de projeção são mescladas em uma imagem unificada por meio de recursos mecânicos e digitais. Um computador provê conteúdo digital ao sistema de projeção e também ao sistema de áudio, que pode variar da configuração mono ao 5.1, a depender da estrutura disponível. A resolução da imagem varia entre salas de exibição, em geral de 1024 x 1024 pixels (1k) a 4096 x 4096 pixels (4K). Em relação ao som, os planetários digitais têm empregado sistemas de áudio com diversos canais distribuídos ao redor da sala, que permitem espacializar também a experiência sonora do espectador.
Figura 2 - Representação esquemática de um planetário fixo, com tela hemisférica, poltronas unidirecionais, projetores digitais, e som espacializado. Fonte: elaborado por Vitor Amaro Lacerda.
Nesse sentido, a experiência audiovisual em uma salas Fulldome é especialmente marcada pela imersão, ou seja, pela sugestão de que o espectador se sinta inserido no ambiente e nas situações representadas, o que é intensamente explorado em produções de cunho científico e pedagógico.
A imagem e a técnica de simulação da realidade virtual tentam mesclar as mídias tradicionais em um meio sintético, a ser vivenciado de forma multissensorial. O objetivo tecnológico (...) é fornecer ao espectador a impressão mais intensa possível de estar no local onde as imagens estão, o que requer a mais exata adaptação da informação ilusória para a disposição fisiológica dos sentidos humanos (…) O projeto mais ambicioso pretende apelar não somente para os olhos, mas também para todos os sentidos, de modo que a impressão de estar de fato em um mundo artificial seja completa (GRAU, 2007, p.31-32).
O Espaço do Conhecimento UFMG conta com um Planetário com sistema híbrido de projeção, fabricado pela empresa alemã Carl Zeiss e composto por um projetor óptico mecânico SkyMaster ZKP4, responsável pela projeção de uma simulação do céu; e dois projetores digitais Spacegate Duo, responsáveis pela projeção de conteúdo digital pré-renderizado. Seguindo um modelo de organização que vem se difundindo pelo mundo, as 65 cadeiras reclináveis desta sala de exibição estão dispostas de forma unidirecional, ou seja, orientadas para uma mesma direção da cúpula.
Tendo como referência o planetário do Espaço do Conhecimento UFMG, a versão original do documentário Inconfidências foi produzida com uma resolução intermediária aproximada de 2048 x 2048 pixels (2K), e um som espacializado, mixado em 5.1.
O desafio da adaptação para tela plana
Com o Planetário do Espaço do Conhecimento UFMG fechado desde março de 2020 devido ao isolamento social, não existia uma previsão de quando seria possível exibir o filme Inconfidências ao público de Belo Horizonte, situação que ainda perdura até o momento da escrita deste trabalho. E diante da impossibilidade do lançamento do filme no Planetário, a solução encontrada pela equipe de produção foi disponibilizá-lo na Internet. Para tal, foi preciso pensar em como adaptar um filme realizado em formato fulldome, com a finalidade da projeção em uma tela hemisférica, para ser exibido nas telas planas dos espectadores virtuais por meio de seus computadores e mídias móveis.
Para realizar essa adaptação, foram discutidas duas possibilidades. A primeira delas seria fazer uma edição nas imagens originais tentando aproximá-las da estética de filmes de tela plana, no formato widescreen com a proporção 16:9. Ou seja, as imagens seriam retrabalhadas na tentativa de criar uma outra versão do Inconfidências, o que certamente demandaria um enorme esforço de pós-produção numa adaptação que poderia não funcionar adequadamente, já que as imagens não foram produzidas para o novo formato. A outra possibilidade seria abandonar a adaptação das imagens para veiculação em tela plana e assumir seu formato circular original, com as distorções características e necessárias a um filme em formato fulldome.
Por questões práticas e também pensando em divulgar novos formatos audiovisuais, optou-se por manter o filme assumidamente em seu formato original, com as imagens circulares e distorcidas. Esta opção, no entanto, possibilitou a adoção de novos elementos que não estão presentes na versão original do documentário, como a moldura que compõe o restante do quadro retangular, que em sua totalidade tem o formato mais difundido de vídeos para Internet, na proporção 16:9. Assim, a composição final consistiu-se de um círculo, com as imagens originais do filme, sobreposto a uma fotografia do minério de ferro, utilizada como textura de fundo com a opacidade reduzida.
Outro elemento importante na composição do quadro e que não está presente na versão original do documentário é a janela contendo uma intérprete de Língua Brasileira de Sinais – Libras. Para muito além do simples aproveitamento de um espaço disponível na tela, a adoção da tradução em Libras tornou esta versão do filme muito mais acessível a um importante público que não era contemplado pela versão fulldome.
E com a intenção de contribuir com a legibilidade dos textos, optou-se por retirar as legendas de identificação dos entrevistados, inicialmente inseridas no interior da imagem circular, transferindo-as para um espaço disponível na tela retangular. Esta opção mostrou-se adequada, pois as legendas originais apresentavam-se muito reduzidas e distorcidas, o que dificultava a leitura. Por outro lado, os textos das telas de abertura e de créditos finais foram mantidos no interior da imagem circular, uma vez que fazem parte da composição do próprio filme. No entanto, a distorção necessária à projeção hemisférica foi reduzida na versão adaptada para tela plana, permitindo uma leitura mais confortável ao espectador deste formato.
Figura 3 - Composição da tela na versão plana, contendo: textura de minério de ferro ao fundo; imagem circular própria da projeção fulldome; janela com intérprete em Libras; legenda de identificação do entrevistado. Fonte: captura de tela da versão plana do filme Inconfidências.
Com tudo isso, a versão plana deixa bastante evidente que trata-se de uma adaptação realizada a partir de um filme produzido originalmente para um formato específico. Não se trata propriamente de uma outra produção, mas de uma adaptação necessária, imposta pelo que a pandemia nos exige neste momento. Contudo, essa transposição de mídias permitiu que novos elementos pudessem ser agregados em consonância com o novo formato, o que contribuiu de forma significativa com a ampliação do acesso ao documentário.
A versão plana do documentário teve sua estreia no dia 11/12/2020, como parte da programação das comemorações dos dez anos do Espaço do Conhecimento UFMG.
Considerações Finais
Ainda em 2021, vivemos no Brasil momentos extremamente difíceis e dolorosos relacionados à pandemia de COVID-19. Mas para além disso, temos visto nossos governantes se aproveitando dessa tragédia humanitária para promover uma flexibilização das regras ambientais. Isso ficou evidente na fala do atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, proferida numa reunião ministerial realizada em 22/04/2020 e tornada pública por decisão judicial da Suprema Corte Brasileira. Naquela oportunidade, o ministro do Meio Ambiente sugeriu que o governo federal, sob a presidência de Jair Bolsonaro, deveria aproveitar o momento em que as atenções da sociedade e da imprensa estavam voltadas para o coronavírus, para então “passar a boiada” da flexibilização ambiental. A partir daí, assistimos à expansão do desmatamento de matas nativas e à perda de grande parte de importantes biomas, como o pantanal e a floresta amazônica, consumidos por incontroláveis e criminosos incêndios ocorridos ao longo do ano de 2020.
Foi neste contexto que optamos por adaptar o filme Inconfidências para exibição em tela plana, além de liberar o seu acesso de forma livre pelo canal do Espaço do Conhecimento UFMG no Youtube. Por um lado, inicialmente tínhamos em mãos um filme praticamente pronto para exibição exclusiva em planetários, capaz de contribuir com a imersão do espectador no tema do documentário e de promover reflexões e debates sobre as questões levantadas. Mas por outro lado não tínhamos nenhuma previsão de quando poderíamos lançá-lo, considerando o fechamento do planetário do Espaço do Conhecimento UFMG por medidas sanitárias ligadas à pandemia de COVID-19, situação que ainda perdura até o momento do encaminhamento do presente trabalho para publicação nos anais da Conferência Internacional de Avanca 2021.
Assim, a adaptação realizada mostrou-se uma decisão acertada, considerando o alcance obtido pelo filme após seu lançamento em tela plana e o debate suscitado a partir de sua exibição nas mídias sociais. Além disso, a ação afirmativa de inclusão adotada nessa adaptação, com a adoção de uma janela de tradução e interpretação em Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, ampliou o acesso do filme a um público que sua versão original fulldome não alcançaria.
Com isso, acreditamos ter contribuído de forma significativa com as discussões sobre um tema de grande interesse local, mas que no contexto sócio-ambiental em que vivemos ganha relevância planetária.
Notas finais
1Agradecemos à CAPES, ao Programa de Pós-Graduação em Artes, e à Pró-Reitoria de Extensão da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) pelo auxílio concedido para inscrição desta comunicação na Conferência Internacional de Avanca 2021 por meio da verba PROEX.
2O Circuito Liberdade é um complexo de instituições culturais situadas no entorno da Praça da Liberdade, na região central de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
3Voltada para a Praça da Liberdade, a fachada frontal externa do edifício funciona como uma grande tela de projeção, chamada de Fachada Digital. Tem como característica a projeção na superfície de vidro do edifício. Para isso, são utilizados doze projetores de alta qualidade que formam uma única tela composta por doze painéis. Artigo sobre a Fachada Digital foi publicado na Conferência Internacional de Avanca em 2015 (Gino, Lacerda e Carvalho 2015)
4Texto original: It is this sense of adventure and discovery combined with the mysteries and infinity of space that has until very recently been the mainstay of nearly all presentations and educational experiences inside a planetarium. With new tools coming into the forefront of the dome presentation toolkit, it is important for all persons associated with planetariums and domed theaters alike to strive to maintain and improve upon this experience.
5Site da Associação Brasileira de Planetários:http://planetarios.org.br/ Consultado em 14/04/2021.
6Veja programação do Festival Immersphere em http://immersphere.com.br/pt/programacao/paralela/ Consultado em 14/04/2021.
7Link de acesso ao documentário Inconfidências: https://www.youtube.com/watch?v=DGzJTOaRvqY&t=2200s Consultado em 14/04/2021
8Immersive Media Entertainment, Research & Arts – Imersa. Disponível em http://www.imersa.org/. Acesso em 14/04/2021.
9Texto original: In more recent times planetariums have been upgraded to provide full dome digital projection, that is, a movie is seamlessly pro-jected onto the dome surface at typically 30 frames per second. For larger planetariums this full dome projection is achieved with multiple projectors, most commonly CRT projectors. The projectors are carefully aligned and edge blended across overlapping projection regions. The system is driven by movies made up of fisheye images, these are usually diced into pieces and played back using specialised graphics hardware. Evenmore recently, high-end graphics systems have been able to project interactive graph-ics in real-time so it is no longer necessary to limit the content to movies. The content is not even limited to astronomy or even to science education, but indeed to any subject matter.
Bibliografia
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Gino, Maurício S., Lacerda, Vitor A., e Carvalho, Kayke Q.
“MUMIA na Fachada: a apropriação de uma telha digital urbana por um festival de animação”. In
Avanca | Cinema 2015. Organizado por António Costa Valente e Rita Capucho, 617-22. Avanca: Edições Cine – Clube de Avanca.
Grau, Oliver. 2007. Arte Virtual: da ilusão à imersão. São Paulo: Editora UNESP: Editora Senac São Paulo.
Leite, Patrícia Kauark. A aventura do conhecimento. In: Almeida, Maria Inês; Leite, Patrícia Kauark (Org.) Demasiado humano. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2010. p.15.
Matthews, Mark. Digital Domes and the Future of Planetariums. Planetarian, dec 2005. Disponível em https://cdn.ymaws.com/www.ips-planetarium.org/resource/resmgr/planetarian/v34-4.pdf Acesso em 14 de abril de 2021.
Filmografia
Inconfidências. 2020. De Maurício Silva Gino. Brasil: Espaço do Conhecimento UFMG. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=DGzJTOaRvqY&t=2200s Consultado em 14 de abril de 2021